Santander driblou a crise graças ao mercado brasileiro
Mark Scott
O banco espanhol Santander teve um bom desempenho durante a recessão porque foi obrigado a evitar os títulos "tóxicos" devido às estritas leis domésticas para o setor bancário. A contrário de vários dos seus debilitados rivais no setor bancário internacional, o Santander está podendo agora expandir-se, e tem com alvo o mercado em crescimento que é o Brasil.
Como o maior banco da zona do euro, composta de 16 países, o banco espanhol Santander apresentou um ótimo desempenho durante a recessão. Uma regulação doméstica rigorosa obrigou este gigante do setor bancário, com sede em Madri, a manter distância dos títulos financeiros tóxicos e, de forma geral, o banco evitou emprestar excessivamente ao combalido setor imobiliário da Espanha. Agora, no momento em que os Estados Unidos e a Europa estão reduzindo os gastos, o Santander reforçou os seus planos de expansão.
Uma peça central dessa estratégia é o Brasil. Outrora conhecido como o gigante adormecido da América Latina, o Brasil - sob a liderança do carismático presidente Luiz Inácio Lula da Silva - transformou-se em uma potência econômica. Segundo estatísticas oficiais, o produto interno bruto do país cresceu 1,9% no segundo trimestre deste ano, em um momento em que várias outras economias de todo o mundo encolhiam. O Citigroup prevê que o produto interno bruto do Brasil aumentará cerca de 5% no próximo ano.
E o Santander se prepara para tirar o máximo de vantagem disso. Sendo já o terceiro maior banco não estatal do Brasil, atrás do Itaú Unibanco e do Bradesco, a companhia espanhola captou impressionantes US$ 7 bilhões (R$ 12,2 bilhões) para financiar a sua expansão naquele país com a venda de ações minoritárias das suas operações brasileiras. Ações adicionais que deverão ser vendidas neste mês elevarão este total para US$ 8,1 bilhões (R$ 14,1 bilhões) - naquela que é de longe, até agora, a maior oferta de venda pública do mundo neste ano.
Impulso ao setor bancário comercial
O dinheiro será bem empregado. O Santander pretende reforçar as suas próprias reservas de capital, expandir a sua rede de agência locais no Brasil em um terço até 2013, e impulsionar os empréstimos no crescente, mas ainda sub-utilizado, setor bancário comercial. "A atuação do Santander no Brasil foi inteligente e bem pensada", diz Robert Tornabel, professor especializado no setor bancário e ex-reitor da escola de administração ESADE, em Barcelona. "O Brasil é uma economia de crescimento rápido que está se tornando uma peça importante para a lucratividade do banco".
De fato, o Brasil respondeu por mais de um quinto dos 4,5 bilhões de euros (US$ 6,8 bilhões, R$ 11,8 bilhões) em "lucros imputáveis", ou lucros líquidos menos ganhos de capital, no primeiro semestre deste ano (os lucros imputáveis são a única medida de rendimentos através da qual o banco fornece uma classificação por país). Isso significa um aumento de 11% em relação ao mesmo período em 2008. Os analistas dizem que a mudança deve-se principalmente à consolidação do Banco Real, do Brasil, que o Santander adquiriu por US$ 16 bilhões (R$ 27,8 bilhões) em 2007 como parte da fatídica aquisição e divisão do gigante financeiro holandês ABN Amro pelo Santander, o Royal Bank of Scotland e o Fortis.
Se desde então o RBS e o Fortis enfrentam problemas, para o Santander a aposta deu ótimos resultados. A sua presença ampliada no Brasil contribuiu para compensar a redução das operações do banco em outras regiões - especialmente Espanha e Reino Unido - durante a pior parte da crise. Os empréstimos no Brasil, por exemplo, saltaram 16% durante o primeiro semestre de 2009, comparados a apenas 1% na Espanha no mesmo período.
Os lucros imputáveis obtidos no Brasil no primeiro semestre chegaram a 961 milhões de euros (US$ 1,4 bilhão, R$ 1,7 bilhão), o que representa um aumento de 12% em relação ao mesmo período do ano passado.
Mercado ainda inexplorado
Os analistas dizem que uma curva ascendente ainda mais pronunciada está por vir. Segundo números do Citigroup, a relação entre empréstimos e produto interno bruto no Brasil - um indicador-chave da maturidade do setor bancário - encontra-se atualmente em apenas 40%, o que é cerca da metade daquela do Chile, um rival regional. E a relação entre os depósitos de varejo e o produto interno bruto é comparável àquela da Colômbia, um país menor e mais pobre. Sendo assim, é óbvio que o presidente do Santander, Emilio Botin, dispõe de uma grande oportunidade para trazer uma parcela maior dos 190 milhões de cidadãos brasileiros para o setor bancário.
"O Brasil continua sendo um mercado de varejo praticamente inexplorado, e é aí que o Santander conta com vantagens", diz Xavier Vives, professor de economia da Escola de Negócios IESE em Barcelona. A estratégia do banco já está se consolidando. Desde que tornou-se proeminente no seu mercado doméstico na década de oitenta, o Santander aliou reduções agressivas de custos - especialmente através do uso de softwares proprietários para serviços administrativos - à venda cruzada de produtos financeiros aos clientes.
O banco está seguindo uma rota similar no Brasil: por exemplo, as despesas operacionais no decorrer do primeiro semestre deste ano caíram mais de 3% em relação ao mesmo período do ano passado, ainda que as rendas tivessem aumentado. E o índice de eficiência das suas agências brasileiras - com base em despesas versus rendas totais - aumentou sete pontos percentuais em um ano, caindo para 37,9%: um dos índices mais baixos dentre todos os bancos no Brasil.
A abertura de 600 novas agências nos próximos quatro anos ajudará também o banco a vender mais produtos como hipotecas e cartões de crédito para a cada vez mais afluente classe média brasileira. De forma reveladora, o Santander concentrou a sua expansão na região sudeste desse país sul-americano, particularmente em torno de São Paulo, onde o produto interno bruto per capita é quase o dobro daquele registrado no norte do país.
Competição acirrada
Mesmo assim, não há garantia de que o ambicioso plano brasileiro do Santander será um sucesso. Tanto os bancos domésticos quanto os internacionais estão procurando tirar vantagem da aquecida economia do país. Isso é particularmente verdadeiro no caso do estatal Banco do Brasil, que continua sendo o maior banco do país e que está diversificando agressivamente os seus produtos financeiros, particularmente no setor de seguros.
E embora o Brasil e, em grau menor, os Estados Unidos, país no qual o Santander entrou recentemente, representem as principais perspectivas de crescimento para o banco, vários títulos problemáticos na Espanha ainda podem reduzir a lucratividade do banco. O Santander diz ter capital suficiente para enfrentar problemas financeiros extras.
Para terem sucesso no Brasil, os espanhóis vão se basear na sua experiência prévia de expandirem-se com sucesso em outros países sul-americanos e na Europa nos últimos 15 anos. E, ao captar investimentos de US$ 8,1 bilhões (R$ 14,1 bilhões), o Botin & Co. ver-se-á em uma provisão privilegiada em um dos mercados financeiros de mais rápido crescimento do mundo. Não é de se admirar, portanto, que o Santander seja visto por muitos como um dos maiores vencedores a emergirem da Grande Recessão.
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/derspiegel/2009/10/28/ult2682u1360.jhtm?action=print
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