"Desde mi punto de vista –y esto puede ser algo profético y paradójico a la vez– Estados Unidos está mucho peor que América Latina. Porque Estados Unidos tiene una solución, pero en mi opinión, es una mala solución, tanto para ellos como para el mundo en general. En cambio, en América Latina no hay soluciones, sólo problemas; pero por más doloroso que sea, es mejor tener problemas que tener una mala solución para el futuro de la historia."

Ignácio Ellacuría


O que iremos fazer hoje, Cérebro?

domingo, 30 de setembro de 2007

Treasure House of England

Visetem The Treasure House of England, http://www.treasurehouses.co.uk/. Blenheim Palace e Woburn Abbey são muito bonitas. Uma casa que fazia parte do consórcio e saiu é a Broadlands, era mais pobrezinha.

Dois artigos da revista 30 dias

Segue abaixo dois artigos da revista 30 dias dirigida pelo ex-primeiro ministro da Itália Giulio Andreotti. O primeiro é um artigo de Andreotti que serve de editorial para a revista que afirma que a fama de Roma, a grandeza de Roma é produto do cristianismo. Roma não seria o que é sem o cristianismo. O outro é uma entrevista com o patriarca da Igreja Greco-Católica Melquita, Gregório III, onde aborda a situação dos cristãos no Oriente Médio, especialmente na Síria. É interessante a informação segundo a qual o Direito Canônico foi transformado em lei civil para os católicos, ou seja, deste modo eles ficam desobrigados de seguir a lei islâmica. No final das contas há duas leis em vigor, uma para católicos, outra para os mulçumanos. Pelo jeito tornar o Estado laico não passa pela cabeça dos sírios.

Artigo de Giulio Andreotti

“Onde Cristo é romano”

Giulio Andreotti

Recordo a afluência de … estranhos quando veio o cardeal Eugenio Pacelli fazer o panegírico da festa de São Jerônimo Emiliani. Alguns anos depois fui à Sala Borromini em um domingo pela manhã para ouvir o mesmo Secretário de Estado que falava sobre: “Roma onde Cristo é romano”. Enunciava conceitos profundos, mas mais do que tudo, criava um clima de diálogo com o auditório

Tinha seis anos quando minha tia Mariannina começou a levar-me consigo, todas as tardes, à função vespertina na nossa paróquia da Praça Caprânica (Santa Maria in Aquiro, junto ao Orfanato dos Padres Somascos, onde estudava meu irmão).

Somente depois da guerra começaram a celebrar as missas vespertinas. Na época recitava-se o rosário, seguido pela bênção eucarística. No mês mariano (maio) havia também o sermão, que se concluía com a sugestão de um pequeno sacrifício a ser oferecido à Nossa Senhora (os “fioretti”).

Os sermões eram feitos com uma técnica muito enfática, quase teatral. O orador que por muitos anos manteve-se no ápice da apreciação era o jesuíta padre Galileo Venturini. Era escriturado com anos de antecipação; e tinha um bom núcleo de admiradores (ou melhor, admiradoras) que o seguiam em todas as suas andanças.

Uma audiência de Pio XII aos seminaristas e aos seus superiores

No ano que veio à nossa paróquia vi que quando descia do púlpito muito suado se enxugava e trocava camisa e camiseta. Embora fosse retórico, era concreto. Suas palavras podiam ser resumidas facilmente, o que não acontecia com os outros. Outros “tenores sacros” teriam do mesmo modo causado maravilhas pelas modulação da voz, mesmo se ao invés do texto tivessem gritado a tábua pitagórica.

As cadeiras eram alugadas por quarenta centavos e ficavam completamente repletas.

Os pregadores que apelavam ao raciocínio faziam muito menos sucesso. Mas a distância de mais de 80 anos ainda recordo dos sábios conselhos do monge beneditino padre Cornelio Cipriani, que como orador era muito entediante.

As igrejas competiam para garantirem um pregador famoso para o panegírico da festa do padroeiro. Recordo a afluência de … estranhos quando veio o cardeal Eugenio Pacelli fazer o panegírico da festa de São Jerônimo Emiliani. Alguns anos depois fui à Sala Borromini em um domingo pela manhã para ouvir o mesmo Secretário de Estado que falava sobre: “Roma onde Cristo é romano”. Enunciava conceitos profundos, mas mais do que tudo, criava um clima de diálogo com o auditório.

Como Papa, dedicou, nas audiências, uma atenção especial aos casais, aos quais era também reservado um lugar particular.

Um dia o presidente italiano Saragat expressou críticas a essas audiências matrimoniais. Disse que ele também poderia introduzi-las em seu governo. Como de resto, o presidente Pertini fez com os jovens.

De modo geral, dado que Roma é considerada (e é) eterna, deve-se perguntar o que mudou desde então. Limito-me a registrar que as procissões eram momentos sugestivos. Tanto a que se fazia por toda a cidade em Corpus Christi, como as “paroquiais” para levar solenemente a Eucaristia aos enfermos.

Pelo multiplicar-se das paróquias, não há mais atividades do Colégio dos Párocos (que em outubro todas as quintas-feiras faziam juntos uma excursão aos Castelli Romani) mas há o agrupamento por setores citadinos.

Há também esquecimento do silencioso braço-de-ferro do clero secular para ter um número de paróquias não inferior ao dos “religiosos”. Todavia o número de seminaristas romanos não é, como em outras dioceses, irrelevante.

Nos estudos internacionais sobre o turismo o maior afluxo no sentido absoluto é reconhecido em Roma. É oportuno citar Dante com “Aquela Roma onde Cristo é romano”.

Seria uma falta não sublinhar também uma outra contribuição cristã ao prestígio de Roma. Refiro-me aos ateneus religiosos, que são todos de grande importância. Desde os históricos (Gregoriana, Angelicum, Propaganda Fide, Alfonsiana) ao moderníssimo dos Legionários de Cristo.

Também, todos os alunos destas universidades religiosas – de onde provém grande parte dos bispos – aprendem a língua italiana. Durante a guerra os nossos prisioneiros concentrados nos cantos mais longínquos do mundo tiveram o conforto da visita de um ex-seminarista romano que em italiano exprimia-lhes solidariedade e afeto.

Não quero fazer comparações, mas certamente Atenas não tem títulos históricos inferiores aos de Roma; o “a mais” de Roma é ligado justamente ao cristianismo.

Todavia foi bizarra a afirmação de Mussolini quando disse que “se o cristianismo não tivesse se sediado em Roma, teria sido uma das muitas seitas como os Essênios”.

E pensar que os fiéis do Duce sustentavam que ele tinha sempre razão.

Entrevista com o Patriarca melquita.

Cristãos nas terras do Alcorão

Com Jesus em meio ao islã

“Eu sempre digo isto com muito amor aos judeus: vocês são, como eu, chamados à fé em Jesus. Como também os muçulmanos. Jesus realmente chama a todos. E a religião dele não é uma nova religião contra as que existiram antes ou depois. É uma coisa diferente. Uma outra coisa.” Entrevista com Grégoire III Laham, patriarca de Antioquia dos Greco-Melquitas

Entrevista com Grégoire III Laham de Gianni Valente

De todos os lados, as atenções voltam a se concentrar na condição presente e no destino dos cristãos no Oriente Médio. Há quem dessa forma, acompanhando o Papa, se mostre solícito pelos dramas e sofrimentos vividos pelo rebanho indefeso de Cristo nas terras em que teve início o cristianismo. Em outros casos, um zelo tão grande parece às vezes determinado por fatores de alinhamento cultural ou político.

Poucos ouvem os argumentos e as razões dos cristãos árabes. Poucos tomam como ponto de partida a maneira como eles vêem o que está acontecendo no barril de pólvora que é o Oriente Médio.

Até por isso, pode ser útil ouvir mais uma vez sua beatitude Grégoire III Laham, patriarca de Antioquia dos Greco-Melquitas desde 2000.

Grégoire III

Para muita gente, o que está acontecendo no Iraque parece ser o epicentro de um fenômeno maior: o desaparecimento dos cristãos de todo o Oriente Médio.

GRÉGOIRE III LAHAM: Jesus nos disse que não tivéssemos medo. E nós estamos sempre em situação de ter medo. Mas um pastor deve encorajar seu povo. Não podemos entrar em pânico. No Iraque existe uma situação terrível de crimes, vingança e terror. Acontece aos cristãos o mesmo que acontece a todos os outros. Aqui, na Síria, recebemos um milhão e meio de refugiados iraquianos, e entre eles os cristãos são uma pequena minoria. Isso significa que todo o mundo está fugindo de lá. Eu sei que há quem jogue com essas coisas no Ocidente. Mas não me parece útil para os cristãos que vivem aqui uma tentativa de isolar os seus sofrimentos dos sofrimentos dos outros.

O patriarca caldeu Emmanuel III Delly disse que com a guerra veio também a perseguição.

GRÉGOIRE III: Qualquer abordagem dos problemas daqui que não parta de critérios meramente políticos repercute sobre nós. Isso aconteceu no Iraque. Os americanos chegaram quase com a intenção declarada de uma nova cruzada, que mudasse a face do Oriente Médio. Agora, no Líbano, eu ouço que estão atribuindo a etiqueta de “cruzados” até aos soldados da Unifil (United Nations Interim Force in Lebanon; nde.). E os cristãos são sempre associados a essas estratégias ocidentais. Na última carta de Natal, eu escrevi: “Caros muçulmanos, não podemos tolerar que entre vocês haja quem nos defina como aliados dos ‘cruzados’. Nós vivemos, trabalhamos, lutamos com vocês. Construímos com vocês o futuro destas nações”.

Em algumas análises, o Oriente Médio é descrito simplesmente como um lugar de perseguição dos cristãos.

GRÉGOIRE III: Aqui, na Síria, o governo trata as igrejas da mesma forma como trata as mesquitas. Somos isentos do pagamento de energia elétrica e outros serviços. No ano passado, um decreto presidencial aprovado pelo Parlamento estabeleceu que os católicos, em questões relacionadas aos direitos individuais, como as matrimoniais e de herança, devem seguir normas jurídicas próprias. Na prática, tomaram o direito canônico para as Igrejas orientais e o transferiram para o direito civil. Uma ou duas vezes por ano vou com meu vigário-geral encontrar o presidente Assad e seus colaboradores. Na Páscoa, ele fez questão de almoçar com todos os patriarcas e chefes das Igrejas. Falamos de política, inclusive das relações entre o Oriente e o Ocidente. Além disso, ministros, parlamentares e xeques vêm nos encontrar.

A Síria seria um Estado “canalha”. Mas, no Oriente Médio, quando os cristãos fogem, muitas vezes fogem para Damasco.

GRÉGOIRE III: Para nós, aqui existe a melhor situação de todo o Oriente Médio. Rezamos para que continue. Sempre existe o perigo de que tudo isso seja desestabilizado, talvez por aqueles que querem forçar as coisas para criar uma nova situação de poder na região.

Na Síria o integrismo religioso também vem crescendo entre o povo?

GRÉGOIRE III: Há um contágio integrista que se vem registrando no mundo inteiro, não apenas no Oriente Médio. Aqui, na Síria, o governo é forte e procura impor limites. Por exemplo, em relação aos jovens, há um grande trabalho em cima de livros de formação cívica. Até os livros de catecismo e de ensino religioso, inclusive os nossos, são submetidos à avaliação dos ministérios da Educação e da Cultura. Há uma vigilância para garantir que essas obras inspirem o respeito mútuo e a convivência, sem instigar o ódio e o desprezo pelas outras religiões. Nosso livro é usado há mais de quarenta anos; uma comissão mista de sacerdotes e professores das diversas Igrejas o reviu em 2002, sob orientação do Ministério da Educação. Eu ponho a mão no fogo por ele.

Que critérios, na sua opinião, devem inspirar o olhar e a postura dos cristãos em relação aos fiéis islâmicos?

GRÉGOIRE III: No Vaticano, já nos disseram que nós, cristãos orientais, devemos trabalhar com o islã para promover os direitos humanos, a emancipação da mulher, a defesa da vida, a liberdade religiosa. Mas o que isso significa? Nós temos uma relação única, específica com o islã, que não é a que vocês têm na Europa com as minorias islâmicas. Eu sempre digo: nós somos a Igreja do islã.

O senhor gosta dessa expressão. Usa-a muitas vezes.

GRÉGOIRE III: O jornal egípcio Al-Ahram chegou a escrever que essa é a melhor fórmula para descrever a condição comum a todos os cristãos nos países árabes e no Oriente Médio. O islã é o contexto em que vivemos e com o qual somos historicamente solidários. Vivemos 1.400 anos no meio deles. Entendemos o islã por dentro. Quando ouço um versículo do Alcorão, para mim é uma expressão da civilização a que pertenço. E a nós cabe testemunhar Cristo no mundo do islã. Temos uma responsabilidade única. Não poderemos responder como Caim, quando o Senhor lhe perguntou onde estava Abel.

A antiga igreja do mosteiro de Mar Sarkis, sob a responsabilidade dos monges melquitas de Cristo Redentor, no vilarejo cristão de Maalula, na Síria

Nas terras do islã não são possíveis estratégias missionárias.

GRÉGOIRE III: Mas podemos aproveitar qualquer contato humano. Mostrar uma Igreja que os ama. Valorizar todas as afinidades e simpatias possíveis. Os organismos vaticanos podem elaborar documentos e mais documentos. Mas, depois, cabe a nós testemunhar Cristo diante dos nossos irmãos islâmicos na vida de todos os dias.

O senhor pode dar um exemplo concreto?

GRÉGOIRE III: Uma vez, no final do Ramadã, o grão-mufti de Damasco, Ahmed Kaftaro, me convidou para pregar do púlpito da mesquita. Quando eu estava em Jerusalém, fui também muitas vezes acolhido na mesquita, depois das manifestações dos palestinos. Ser Igreja do islã significa também isso.

Enquanto isso, no Ocidente, aumenta o número de pessoas que afirmam que a violência é um elemento arraigado na própria natureza do islã.

GRÉGOIRE III: São inverdades que tomam como pretexto uma leitura distorcida do discurso de Regensburg, que o próprio Papa desautorizou. A própria citação de Manuel Paleólogo, que gerou tantas reações violentas, era uma extrapolação de uma discussão muito longa entre o imperador e o sábio islâmico, que já durava dias. O Papa não tinha nenhuma intenção de ofender o islã. Além do mais, o próprio Evangelho pode se tornar objeto de manipulações malignas e distorcidas. Por exemplo, quando Jesus diz: “Não vim para trazer a paz, mas a espada”.

Os intelectuais ocidentais que mais polemizam com o islã insistem em dizer que “o nosso Deus não é o Deus deles...”.

GRÉGOIRE III: Eu evitaria discussões teológicas inconclusivas com os irmãos islâmicos para estabelecer se adoramos ou não o mesmo Deus. Isso me parece ser coisa de academia teológica. O mistério de Deus é grande demais, nós não podemos compreendê-lo. Diante dele, nós exclamamos: que bonito! Mas o que é que eu compreendo dessa beleza, o que é que compreendo de Deus? Quando confessamos o mistério da Trindade, talvez a beleza desse mistério possa tocar e surpreender também os outros. Mas, depois, não nos cabe “demonstrar” esse mistério. Correríamos o risco de ser temerários. Portanto, é melhor ficar com o que indicou o Concílio Vaticano II: “A Igreja vê os muçulmanos com carinho, porque adoram a um único Deus”, e, se eles “não reconhecem Jesus como Deus, veneram-no, no entanto, como profeta. Honram Maria, sua mãe virginal, e até a invocam às vezes com devoção”. De resto, nem o judaísmo reconhece a Trindade e a divindade de Jesus, Filho de Deus.

Às vezes as Igrejas do Oriente são apresentadas como receptáculos de anti-semitismo.

GRÉGOIRE III: A verdade é exatamente o contrário. Eu sempre digo isto com muito amor aos judeus: vocês são, como eu, chamados à fé em Jesus. Como também os muçulmanos. Jesus realmente chama a todos. E a religião dele não é uma nova religião contra as que existiram antes ou depois. É uma coisa diferente. Uma outra coisa. Something else, como dizem os ingleses.

A respeito das relações com os cristãos ortodoxos, há alguns anos foi lançada a hipótese, como experiência local de reconciliação, de que a Igreja de vocês e o patriarcado ortodoxo de Antioquia retornassem à plena comunhão.

GRÉGOIRE III: Cultivamos esse projeto talvez com excessiva euforia, como se fosse uma coisa que pudesse ser realizada de hoje para amanhã. O patriarca Maximos, meu predecessor, já estava velho. Recebemos de Roma uma advertência: continuem a dialogar, mas não cheguem a resultados definitivos no campo teológico sem um acordo prévio com a Santa Sé. Infelizmente, nossa hierarquia tomou isso como um sinal para parar. E agora a coisa foi deixada de lado. Mas de qualquer forma temos relações de fraternidade com os ortodoxos, os retiros do clero, inclusive, são feitos juntos.

Na sua opinião, quais são as perspectivas do atual diálogo católico-ortodoxo em torno dos temas da colegialidade e do primado?

GRÉGOIRE III: A Igreja Ortodoxa não pode aceitar a eclesiologia romana enquanto tal. É preciso entender que a eclesiologia desenvolvida na Igreja latina não pode se impor aos cristãos orientais. Eles podem aceitar o primado do Papa como titular da prima sedes e como última instância à qual recorrer. Mas não a prática do centralismo sem uma colegialidade real. Se Roma quer continuar o diálogo, é preciso retomar as fórmulas que Ratzinger expôs na década de 1970 a respeito da relação com as Igrejas do Oriente.

No mundo católico, quando se fala de diálogo com os ortodoxos, o ponto de partida muitas vezes também é a relação entre Igreja universal e Igreja local.

GRÉGOIRE III: A Igreja universal não é a soma de muitas Igrejas locais. E nem mesmo é um conceito abstrato. A Igreja de Cristo existe concretamente num determinado lugar. São Clemente, papa, pôs como cabeçalho de sua carta: “Da Igreja de Deus, que reside em Roma, à Igreja de Deus, que reside em Corinto”. Não escreveu à Igreja “local” de Corinto. Quando estão presentes os sacramentos, a fé, o Credo, o que é que falta? Aí está também o Papa, pois o bispo ou o pároco que celebram a Eucaristia estão em comunhão com o Papa. A Igreja una, santa, católica e apostólica está presente até mesmo numa pequena paróquia na qual o sacerdote celebra a missa diante de um ou dois fiéis. Não é que exista “mais” Igreja quando todos os bispos estão reunidos em Concílio. Uma gota do mar tem todos os elementos do resto da água do mar. Assim, cada Igreja, num determinado lugar, tem todos os elementos da única Igreja de Cristo.

O patriarca de Antioquia dos Greco-Melquitas, Grégoire III

O que o senhor responde a quem diz que as Igrejas católicas orientais são um obstáculo à reconciliação com os ortodoxos?

GRÉGOIRE III: As Igrejas orientais católicas se transformam num problema sobretudo porque os ortodoxos vêem o tratamento que às vezes se reserva a elas. Elas são definidas Igrejas sui iuris, mas, na prática, não se reconhece que o patriarca é chefe e pai de sua Igreja. São nomeados bispos para as nossas comunidades na diáspora, por exemplo nos países americanos, e nós não temos voz ativa sobre essas decisões. Nossos bispos recebem questionários nos quais se pergunta a eles: a que Congregação vocês estão subordinados? Sabe lá o que pensariam os patriarcas e os metropolitas ortodoxos, se lessem isso: eu, patriarca, eu, bispo, “subordinado” a um escritório vaticano? O que isso significa?

A respeito das Igrejas orientais, costuma-se dizer: muitas cúrias, zelosas de suas prerrogativas, e poucos fiéis, cada vez menos. Mostra-se divisão justamente onde as minorias cristãs deveriam se unir. O que o senhor pensa dessa objeção?

GRÉGOIRE III: Na Itália também existem dioceses extremamente pequenas. Além do mais, temos aqui um elemento da tradição que deve ser respeitado. Uma comunidade de fiéis siro-católicos ou ortodoxos, por menor que seja, não pode ser comparada aos greco-ortodoxos, aos latinos, aos caldeus. Vá ouvir suas liturgias, ouça seus hinos... Já no Concílio Vaticano II alguns vinham com esta idéia: unamos todos os cristãos de um país sob um rito único e um mesmo bispo ou patriarca. No Líbano o maronita, na Síria o melquita, no Egito o copta... Mas só quem olha de longe, com olhos de contador, mais que de bispo, pode pensar em homologar tradições tão diferentes e tão ricas.

E o que o senhor responde àqueles que reprovam a animosidade de vocês perante Roma?

GRÉGOIRE III: Estamos em Damasco. Aqui, desde que, em 1724, voltamos à comunhão com o bispo de Roma, vivemos como foras-da-lei durante 120 anos. Os sacerdotes iam para as liturgias levando os trajes escondidos em cestas, entravam nas casas e celebravam a missa em voz baixa. Sofremos muito, por afirmar nossa comunhão com a sé de Roma. É um sinal de quanto damos importância a isso.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Chávez e Galbraith

Chávez: 'Galbraithiano'
by GREG GRANDIN The Nation
[from the October 15, 2007 issue]

Last year, the New York Times reported that Hugo Chávez, in his
speech before the United Nations--the one in which he called George
W. Bush the Devil and urged Americans to read Noam Chomsky--expressed
regret that he hadn't had a chance to meet the linguist before he
died. A call to Mr. Chomsky's house, the Times writer quipped, found
him very much alive. The Times, though, had to issue a quick
correction when, upon review of the original Spanish, it became clear
that Chávez was referring not to Chomsky but rather to John Kenneth
Galbraith, who had indeed passed away a few months before.

There is something more than a little ironic about this incident,
where the press, in a rush to ridicule the controversial Hugo Chávez,
lost John Kenneth Galbraith in translation, for it is exactly the
Harvard economist's brand of New Deal social democracy, itself long
expunged from public discussion, that would allow for a more honest
consideration not just of Chavismo but the broader Latin American
left of which it is a vital part.

Chávez has described himself as a "Galbraithiano" and says he started
reading the economist, whose books have been available in Spanish in
Latin America since the 1950s, as a teenager. Long before he began
referring to Chomsky and other currently better-known political
thinkers, he cited Galbraith to explain his economic policies; at the
beginning of his presidency, in 1999, for example, he urged a
gathering of Venezuelan industrialists to support his mild reform
program, quoting Galbraith to warn that if they didn't, the "toxins"
generated by "extreme economic liberalism" could "turn against the
system and destroy it."

Galbraith is celebrated not just by Chávez but by a wide range of
reformers, including Ecuador's new president, Rafael Correa, himself
an economist. This popularity reflects a growing enthusiasm for the
state regulation of the economy that Galbraith prescribed. As Latin
America struggles to remedy the damage caused by two decades of
failed free-market orthodoxy--which has produced dismal growth rates
and widespread social turmoil and misery--politicians are
rehabilitating key macroeconomic principles unthinkable a decade ago.
Argentina, for example, has generated the region's most impressive
growth by lowering interest rates, maintaining a competitive currency
exchange rate, enacting price controls to stem inflation and driving
a hard bargain with international creditors, thus wiping out
two-thirds of the country's external debt and freeing up state
revenue for social spending and investment.

Galbraith has attracted admirers in Latin America not just for his
macroeconomics but for his critique of corporate monopolies. His
belief that corporations are political instruments with the incentive
and ability to corrupt democracy resonates today in a region where
much of the economy is controlled by foreign firms and where
corporate TV (which Galbraith believed had little to do with free
speech and everything to do with manufacturing consumer demand) has
become a bulwark of elite privilege. Galbraith's solution was to use
the state to set up a system of what he called "countervailing
power," enacting aggressive union protection, unemployment insurance,
subsidies, welfare and minimum wage guarantees to counter monopolies
and force a more just distribution of national wealth.

In Latin America, a similar version of democratic developmentalism
held sway in the early 1940s. Reformers from across the political
spectrum believed the region's oligarchy to be an obstacle to
modernization and thought the best way to weaken its deadening grip
was to empower those in its thrall. But the cold war cut short this
democratic experiment, as Washington threw its support behind
reactionary allies in order to insure continental stability.

Developmentalism continued into the 1970s but under the auspices of
either authoritarian or military regimes, which responded to demands
for a more equitable share of power and wealth with increasing
repression, culminating in the wave of terror that swept the region,
from Chile to Guatemala, in the 1970s and '80s. This violence, which
in many countries decimated the left, made possible the radical
free-market economics that reigned throughout Latin America during
the last two decades of the twentieth century.

The re-emergence of the Latin American left signals a revival of
democratic developmentalism, but with a key difference. While in the
1940s reformers sought to extend political power through unions and
peasant associations vertically linked to parties or leaders, today
they rely on a diverse, horizontal array of "new social movements" to
counter their countries' extreme concentration of wealth and
political power--Brazil's Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra, for example, or Bolivia's Movimiento al Socialismo, less a
political party than a coalition of social movements, or Ecuador's
powerful indigenous groups.

But it is Venezuela that has the most advanced partnership between a
state reclaiming the right to regulate the economy and a diverse
array of antineoliberal social movements. What sets Chavismo apart
from past populist experiments in Latin America is its heterogeneity.
It is impossible to spend any time in urban barrios, among co-op
members, community media and other cultural activists, or in the
countryside with peasant organizers and not be impressed with their
diversity of interests, civic investment and commitment to building a
more humane society.

The countervailing power of left civil society organizations--many
existed before Chávez's ascendance; some were founded afterward--has
turned Venezuela into a vibrant democracy and is key to understanding
not just the government's survival in the face of a series of
formidable antidemocratic assaults but its evolving program, as many
of its initiatives come not top-down but from the grassroots. Last
December a respected Chilean polling firm found that in Latin America
only Uruguayans held a more favorable view of their democracy than
Venezuelans.

The question Venezuela faces is how to institutionalize this
relationship between a fortified executive and an empowered citizenry
while protecting individual rights and limiting corruption. Debates
are under way over a series of constitutional reforms, to be voted on
in a national referendum in December, that attempt to do just that.
While the international media have focused on a proposal to remove
presidential term limits, other initiatives would greatly strengthen
community councils, created two years ago as the building blocks of
Venezuela's "participatory democracy," in charge of a range of local
issues, from education and healthcare to sanitation and road repair.
While critics see the councils as another mechanism for Chávez to
strengthen his power, the Washington Post writes that in "the
neighborhoods, it's hard to find anything but bubbling enthusiasm."

Could Chavismo devolve into old-style authoritarianism? Of course.
But the record so far indicates otherwise. For all his rhetorical
excess, Chávez has presided over an unprecedented peaceful social
revolution, doubling his electoral support in the process. Save for
Chile's Popular Unity government--which never received nearly as much
approval at the polls as Chávez's Bolivarian experiment has--it is
hard to think of another instance where such a profound reordering of
political and economic relations has been ratified so many times at
the ballot box. This is a remarkable accomplishment, for revolutions,
by their nature, tend to generate crises that drain away much of
their initial support, producing cycles of violence and repression.

This achievement is rarely reported on in the US media. Chávez often
repeats an observation by one of his favorite economists to bring
home the point. "Never before," the Venezuelan president quotes
Galbraith as saying, "has the distance between reality and
'conventional wisdom' been as great as it is today."

Greg Grandin is the author of Empire's Workshop: Latin America, the
United States, and the Rise of the New Imperialism (Metropolitan). He
teaches history at NYU.

Procura-se um botafoguense desesperadamente!

Nesta quinta-feira cheguei à conclusão que preciso conhecer um botafoguense urgentemente, estou perdendo muitas piadas. Meu Deus, diante do absurdo que é o Botafogo fica até sem graça sacanear com o Corinthians, ou mesmo o Santos por não conseguir ir para Libertadores. Obviamente que se o Corinthians cair vai ser mais engraçado que os vexames do Botafogo, mas vexame mesmo ainda será o Botafogo, da porcaria de time que o Corinthians tem nada se espera. e se o Luxemburgo não conseguir classificar o Santos nem para a pré-libertadores também será muito divertido. Mas piada igual ao Botafogo só se o São paulo conseguisse perder o título do brasileirão. Que vontade de conhecer um botafoguense! Não se intimidem, botafoguenses, apresentem-se!

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Atenção Alunos de História das Relações Internacionais!

Ouçam aqui La strasbourgeoise. Uma música francesa contra a Prússia posterior a Guerra Franco-Prussiana de 1870.

Petit papa c'est donc la mi-Carême,
Et te voici déguisé en soldat.
Petit papa, dis moi si c'est pour rire,
Ou pour faire peur aux tous petits enfants. )bis

Non non ma fille, je pars pour la Patrie,
C'est un devoir où tous les papas s'en vont.
Embrasse moi petite fille chérie,
Je rentrerais bien vite à la maison. )bis

Dis moi maman, quelle est cette médaille,
Et cette lettre qu'apporte le facteur ?
Dis moi maman, tu pleures et tu défailles,
Ils ont tué petit père adoré. )bis

Oui mon enfant, ils ont tué ton père,
Pleure avec moi, car nous les haïssons.
Quelle guerre atroce qui fait pleurer les mères,
Et tue les pères des petits anges blonds. )bis

La neige tombe aux portes de la ville,
Là est assise une enfant de Strasbourg.
Elle reste là malgré le froid, la bise,
Elle reste là malgré le froid du jour. )bis

Un homme passe, à la fillette donne,
Elle reconnaît l'uniforme allemand.
Elle refuse l'aumône qu'on lui donne,
A l'ennemi elle dit bien fièrement : )bis

Gardez votre or, je garde ma puissance,
Soldat prussien, passez votre chemin.
Moi je ne suis qu'une enfant de la France,
A l'ennemi je ne tends pas la main. )bis

Tout en priant sous cette cathédrale,
Ma mère est morte sous ce porche écroulé.
Frappée à mort par l'une de vos balles,
Frappée à mort par l'un de vos boulets. )bis

Mon père est mort sur vos champs de batailles,
Je n'ai pas vu l'ombre de son cercueil.
Frappé à mort par l'une de vos balles,
C'est la raison de ma robe de deuil. )bis

Vous avez eu l'Alsace et la Lorraine,
Vous avez eu des millions d'étrangers.
Vous avez eu Germanie et Bohème,
Mais mon p'tit coeur vous ne l'aurez jamais,
Mais mon p'tit coeur il restera français. )bis

Saudades de Cláudio Humberto Rosa e Silva!

É verdade, a que ponto descemos, é possível ter saudades do tempo de Cláudio Humberto Rosa e Silva. Cláudio Humberto Rosa e Silva foi alçado do nada para a posição de porta-voz do governo Collor, defendeu com unhas e dentes o governo, adotou a postura do bateu-levou. Após sair do governo tem uma coluna de relativo sucesso mais pelas notinhas difamatórias do que por notícias de verdade. Mas Cláudio Humberto Rosa e Silva nunca foi diferente disso e nunca quis ser. Alguns colegas jornalistas notórios de Cláudio Humberto não tem o mesmo comportamento. Tereza Cruvinel está deixando a sua coluna Panorama Político no jornal "O Globo" para assumir a presidência da TV pública criada pelo governo Lula e no mesmo movimento retira a jornalista Helena Chagas do SBT para ir para a TV pública. Tereza Cruvinel é também comentarista da Globo News, já foi uma das meninas do Jô, no primeiro governo Lula promoveu um almoço em sua casa em Brasília para o presidente os jornalistas que cobrem o Planalto para tentar melhorar as relações entre Lula e os jornalistas que estavam bastante tensas na época. Esse comportamento era suspeito, mas nunca vi uma defesa ardorosa do governo Lula. Ao contrário, da Helena Chagas no seu blog se mostrou claramente petista ultimamente. Não há um problema em jornalistas serem petistas, mas há um problema quando o governo encontra quadros para ocupar cargos públicos em jornalistas da grande imprensa. Cláudio Humberto não era nada. Mas quando Tereza Cruvinel, Franklin Martins, Helena Chagas saem de posições na grande mídia para ocupar cargos públicos coloca-se uma suspeita muita grande sobre as relações anteriores e sobre as opiniões que foram emitidas sobre o governo. Não é muito diferente do comportamento de Mônica Veloso, também jornalista, a diferença é apenas o local onde a "atividade jornalística" é exercida. Daí se nota que o problema do Brasil não é apenas o controle da imprensa por poucas empresas, mas a relação promíscua entre os principais jornalistas do país e os governo do dia.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Resposta Mercadante

A assessoria do Senador Mercadante já enviou três e-mails após o envio da minha carta aberta com a resposta padrão do senador Aloízio Mercadante às críticas que lhe foram dirigidas, estou sem tempo para comentar as justificativas agora, mas seguem na ordem inversa em que foram enviados os e-mails, inclusive uma parte que foi repetida.

Assunto:

RES: Carta aberta ao senador Aloísio Mercadante

Data:

Tue, 25 Sep 2007 15:55:17 -0300

De:

"Sen. Aloizio Mercadante Oliva"

Para:

"Corival Carmo"

Prezado Corival,

Espero que leia e compreenda as razões do meu voto e as providências que estão sendo tomadas em relação aos processos contra o senador Renan Calheiros:

1) Nova representação contra o senador Renan Calheiros - Conforme tenho dito, esse processo apenas se iniciou. O senador Renan Calheiros não foi absolvido. A Mesa do Senado acaba de receber nova denúncia de que Renan Calheiros teria participado de um esquema de desvio de dinheiro em ministérios chefiados pelo PMDB. Essa nova representação somente agora passará a ser analisada. Portanto, novamente gostaria de esclarecer que são quatro representações, quatro processos diferentes. Estamos julgando um único mandato, mas estamos analisando quatro representações. O julgamento não acabou. Haverá mais três votações, que podem levar à cassação do mandato do senador Renan. Eu sobrestei meu voto para aguardar a análise de todos os processos e, assim, formar uma convicção definitiva diante do conjunto das acusações. Defendo que os processos podem até ter relatores diferentes, mas deveriam ser todos apreciados numa única sessão, porque, enquanto não dermos um voto terminativo sobre o futuro do senador Renan Calheiros, a Casa continuará se desgastando. Volto a dizer: em relação ao primeiro processo, não há conclusão sobre a tese fundamental da denúncia de que a empreiteira Mendes Júnior pagou, por meio de lobista, as contas pessoais do presidente do Senado. Mas considerei que há graves indícios que precisam ser esclarecidos. Ficaram dúvidas e incertezas. Sendo assim, na votação desse primeiro processo, eu não poderia ter votado pelo arquivamento de modo algum, e não poderia absolver Renan. Ainda não há uma visão abrangente, acabada do processo. Meu voto não foi de omissão. Foi um voto transparente, de quem entende que o julgamento de mérito se faz com base na conclusão do processo das quatro denúncias, quando, então, será possível assumir uma posição definitiva.

2) Licenciamento de Renan - Conforme disse em meu discurso da última terça-feira, na tribuna do Senado, já havia defendido e continuo defendendo que o presidente Renan se licencie. Considero que ele deve ter assegurado o direito de defesa, mas, ao insistir em sua permanência no cargo, Renan prejudica as votações e o andamento dos trabalhos na Casa e é grande o desgaste institucional. É como se os grandes erros que ele cometeu, que poderão ser crimes se forem comprovados, fossem da própria instituição.

3) Sessões abertas - Um requerimento pedindo que as sessões futuras sejam abertas foi apresentado e apoiado pela bancada do PT e pelos líderes dos partidos, a partir de um pronunciamento meu, que sempre defendi o voto aberto, essencial para dar a transparência necessária e evitar qualquer tipo de manipulação do voto.

4) Voto aberto - Aprovamos na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, nesta quarta-feira, emenda à Constituição que acaba com todas as votações secretas no Congresso Nacional. Gostaria de lembrar que nos últimos 20 anos o PT luta pelo voto aberto. Fomos derrotados em 2003. Nesta quarta-feira, na sessão da CCJ, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) apresentou parecer mantendo o sigilo nas votações de indicações e vetos, mas alterou o documento a partir das minhas argumentações. Passou a defender a extinção do voto secreto. O parlamentar tem que assumir sua responsabilidade. Acho que é preciso ser absolutamente radical na transparência. É preciso ter coragem para assumir responsabilidades, e tenho feito isso. Sempre fiz. O que é inconcebível é que possamos ter 43 senadores anunciando ter votado pela cassação de Renan, quando, no painel, foram registrados somente 35 votos contra o presidente do Senado. Isso fragiliza a representação e não permite ao eleitor se identificar ou não com a votação de quem a tenha feito. Vou trabalhar com afinco, não vou me ausentar, não vou me omitir, serei coerente. Declararei meu voto definitivo assim que houver o julgamento final desse processo, a partir do conjunto dos indícios e das provas oferecidas para essas denúncias.

Um abraço

Senador Aloizio Mercadante.

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL O GLOBO DE 23/09

Danton

ALOIZIO MERCADANTE

O cineasta Andrezj Wajda tem filme, intitulado "Danton", cuja lembrança é oportuna neste momento. Nele, há dois grandes personagens: Danton e Robespierre, os quais simbolizam formas antagônicas de praticar política e concretizar princípios éticos. Danton, líder dos girondinos, é transparente, corajoso e conciliador. Insurge-se contra o banho de sangue realizado em nome de princípios supostamente éticos da Revolução Francesa. Robespierre, líder jacobino, é, ao contrário, personagem opaco, intransigente e pusilânime.

Vê a Revolução como processo de purificação, no qual não há lugar para a defesa do indivíduo e dos seus direitos, somente para a punição implacável e imediata, nos covardes julgamentos políticos.

Robespierre manda executar Danton. Mata-se o humano na política e a racionalidade na ética.

O jacobinismo, personificado por Robespierre, representa a barbárie da intransigência, que conduz ao autoritarismo e à ausência do debate democrático.

Pois bem, o jacobinismo tardio que se apoderou do cenário político nacional, neste país que clama, com razão, pelo fim da impunidade, vem impedindo que minha consistente posição sobre o julgamento do senador Calheiros seja compreendida. Com efeito, o maniqueísmo jacobino é, por definição, simplista. Assim, qualquer coisa que escape à sua estreiteza dogmática torna-se incompreensível. Porém, como tenho a fé que Danton tinha na racionalidade humana, vou explicar novamente a minha posição.

Acho um grave erro que o Senado julgue o decoro de um mandato com base em quatro processos distintos. Isso é procedimento irracional que confunde o eleitor, alonga desnecessariamente o julgamento, desgasta a instituição e impede o pronunciamento coerente e bem embasado sobre o tema.

Na realidade, o Senado montou uma armadilha contra si mesmo, pois, como os processos são desconexos, eles ensejam votações díspares. Pode-se votar pela cassação em um e pela absolvição em outro. Como a população poderá entender essa contradição? Como ter coerência de posicionamento ao longo desse processo pulverizado que induz à inconsistência? Preocupado com essa situação, na sessão do dia 12 tentei propor o adiamento da discussão e a articulação dos processos para que pudéssemos, numa única e aberta sessão de votação, com as investigações concluídas e todos os elementos à disposição, julgar o senador Calheiros de forma definitiva e firme. Infelizmente isso não foi possível, dado o tenso clima da sessão.

Vi-me, assim, num dilema. Votar pela cassação significava condenar um parlamentar à perda de seus direitos políticos com base nessa primeira e precária fase do processo, que suscitava mais dúvidas do que certezas, já que não havia prova conclusiva da acusação, qual seja: que a empreiteira teria pago despesas pessoais do senador.

Por outro lado, a absolvição implicava arquivamento das denúncias cuja investigação queria aprofundar, consciente de que teríamos mais três processos para serem analisados. Resolvi, assim, sustar a minha manifestação, coerentemente com a proposta de julgar o mandato com todas as investigações concluídas e dar meu voto de mérito num único e definitivo escrutínio.

Enfatizo, ademais, que há muito insistia para que o senador Calheiros se afastasse da presidência, de forma a preservar a instituição e assegurar a normalidade dos processos.

O meu voto pela abstenção nessa fase preliminar do processo foi, portanto, um voto dado com transparência e convicção, ao contrário dos votos envergonhados daqueles que declaram uma coisa aos jornais, mas fazem o oposto no Senado. Foi voto de consciência, dado num contexto no qual os políticos têm de ter postura de magistrados, e de modo algum voto covarde, pois tinha conhecimento pleno de que ele me traria grande desgaste político e pessoal, e tampouco voto omisso, já que sabia que a evolução das investigações possibilitaria, até o final do processo, manifestação definitiva.

Quero criar as condições para que o Senado julgue seu presidente como a população quer e como a democracia exige: de forma aberta e decidida, com amplo direito à defesa e provas além da dúvida razoável. Quem conhece minha história sabe que nunca me omiti e sempre me bati pela ética na vida pública. Porém, no necessário combate à impunidade não podem prevalecer os linchamentos e os julgamentos políticos, típicos da intransigência irracional de Robespierre, mas sim a racionalidade e o respeito aos direitos e garantias individuais, presentes na coragem cívica de Danton.

ALOIZIO MERCADANTE é senador (PT-SP).

Assunto:

RES: Carta aberta ao senador Aloísio Mercadante

Data:

Thu, 20 Sep 2007 11:08:06 -0300

De:

"Sen. Aloizio Mercadante Oliva"

Para:

"Corival Carmo"

Razões do meu voto

"Os juízes devem ser homens de Estado. É necessário que saibam discernir o espírito de seu tempo, afrontar obstáculos que é possível vencer e desviar-se da corrente, quando o turbilhão ameaça arrastar, junto com eles mesmos, a soberania da União e a obediência devida a suas leis". Tocqueville

Percebo e compreendo o sentimento da sociedade, que quer a cassação do Senador Renan Calheiros. Ao longo de mais de 100 dias, diante de tudo o que foi publicado, verdade ou não, é natural que seja essa a vontade e a conclusão das pessoas. Trata-se de um julgamento que não apresenta grandes dificuldades, feito ao sabor da percepção dos acontecimentos veiculados pela mídia.

De minha parte, também seria mais fácil me esconder no voto secreto, como infelizmente tantos fizeram, sem que ninguém sequer soubesse minha posição, ou simplesmente acompanhar o movimento da sociedade e do eleitor, sem preocupar-me com a imprescindível proteção aos direitos e garantias individuais que julgamentos relativos à cassação requerem. Poderia estar, agora, confortavelmente recebendo elogios de todos.

Não foi essa a minha atitude. Fiz o difícil e o necessário. Naquele momento, eu não era simplesmente um parlamentar, mas um juiz diante de uma decisão que poderia tirar da vida pública por mais de 10 anos um senador eleito com aproximadamente 80% dos votos de seu estado. Tais julgamentos não podem ser fáceis, pois incidem diretamente sobre direitos e garantias individuais.

Porém, alguns argumentam que o julgamento no Senado é eminentemente político e não precisa ter o rigor e nem o tempo dos julgamentos jurídicos. Não é verdade. É óbvio que todo processo dessa natureza tem como pano de fundo uma disputa política, principalmente quando está em jogo a Presidência da Casa. Essa disputa, no entanto, não deve contaminar o processo. Julgamentos políticos são típicos de ditaduras. Numa democracia, quaisquer julgamentos, principalmente aqueles que incidem sobre os direitos e as garantias individuais, têm de respeitar princípios jurídicos universais, como o do devido processo legal, o do amplo direito à defesa e, acima de tudo, o de que o ônus da prova para além da dúvida razoável cabe ao acusador. São exatamente esses aspectos formais do processo que garantem o respeito aos direitos e garantias individuais e a lisura dos julgamentos. Não fosse desse modo, os julgamentos seriam, aí sim, meras formalidades.

Coerentemente com esses princípios e preocupado com o desgaste do Senado, defendi na sessão que fosse adiada a decisão, por considerar que não havia ainda no processo provas conclusivas de que os pagamentos à Sra. Mônica Veloso foram feitos pela empreiteira à qual era vinculado o lobista amigo de Renan Calheiros, já que a leitura atenta dos pareceres revelava mais indagações do que certezas. Tampouco havia no processo a tão necessária análise das outras acusações que pesam contra o Renan Calheiros, como seu eventual envolvimento com a compra de emissora de rádio por intermédio de laranjas, a possível intervenção indevida e ilegal em favor da cervejaria Schincariol e o noticiado esquema de beneficiamento de instituição bancária para atuar com créditos consignados. Assim, era impossível, naquele momento e com as informações disponíveis, emitir um juízo de valor conclusivo sobre a culpa do Senador Calheiros.

Considerei, por outro lado, que também não era possível inocentá-lo em definitivo, pois há indícios de crime tributário, que só serão configurados após a devida investigação pela Receita Federal. Outra frente de investigação também está em andamento no Ministério Público Federal, já autorizada pelo Supremo Tribunal Federal, que tem demonstrado extremo rigor na análise de processos que envolvam parlamentares.

Ante a impossibilidade do adiamento da decisão, vi-me num dilema ético. O voto "sim" significava a culpa comprovada acima de quaisquer dúvidas e a cassação. O voto "não", por seu turno, significava o reconhecimento de uma inocência ainda em questão e o arquivamento do processo. Optei, dessa maneira, pela abstenção. Portanto, não dei esse voto por falta de convicções, mas porque acreditava e continuo a acreditar que todos os processos abertos no Conselho de Ética devam seguir com rigor, até que se possa fazer um julgamento final e conclusivo sobre todas as acusações. Defendo, inclusive, que o Senador Renan Calheiros deva licenciar-se da Presidência do Senado, de forma a assegurar que os processos transcorram com isenção e sem percalços de qualquer tipo.

Não foi uma decisão fácil. Tive de abstrair meus interesses políticos e eleitorais e repelir a sedução do aplauso da opinião pública. Tampouco foi uma decisão coletiva, pois, ao contrário do que foi noticiado de forma maliciosa, não solicitei voto a ninguém e respeitei as convicções de todos.

Foi uma decisão difícil e solitária e o meu voto foi o voto do magistrado que busca pesar cuidadosamente todos os aspectos jurídicos do processo na balança da Justiça e que se rege por lógica e tempo obviamente distintos daqueles utilizados pela mídia.

Estou, é certo, pagando um preço político e pessoal caro por ter tomado essa decisão e não peço que concordem com ela. Mas quero que compreendam que foi uma decisão tomada com transparência e com base em princípios e convicções. Poderia, é claro, ter tomado outra decisão com base apenas nas minhas conveniências políticas e eleitorais. Porém, nesse caso, eu teria de pagar um preço terrível: o preço daqueles que votam contra suas convicções.

E esse preço, podem acreditar, eu não poderia jamais pagar.

Senador Aloizio Mercadante.

Discurso proferido em 18.09.2007

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Com a palavra o Senador Aloizio Mercadante, por permuta com o Senador Raimundo Colombo.

V. Exª dispõe de 10 minutos, Senador Aloizio Mercadante.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero, de um lado, apresentar algumas propostas de encaminhamento do chamado caso Renan Calheiros; e, de outro, aprofundar o debate político que se iniciou em torno dessa relevante questão ao Senado e à República.

Em primeiro lugar, gostaria de hipotecar restrito apoio àqueles que subiram na tribuna para defender a transparência do processo de votação do Senado Federal. É inconcebível que tenhamos uma sessão como aquela, em que todo e qualquer tipo de especulação acaba sendo publicada e em que o direito de defesa, pelo menos daquilo que você não disse, ou que você disse, ou que você fez, ou que você não fez, está definitivamente comprometido e fragilizado.

Temos um instrumento de mudança regimental. Basta todos os Líderes desta Casa assinarem o compromisso - três quintos dos votos, art. 412 do Regimento -, e nós poderemos instituir imediatamente a votação aberta.

Portanto, quero propor ao Presidente em exercício nesta sessão, Senador Tião Viana, que encaminhe essa sugestão à Mesa de pautar imediatamente a transparência de toda e qualquer sessão do Plenário. Formalizarei a minha proposta do art. 412 do Regimento.

Segundo, também nosso irrestrito apoio para que toda e qualquer sessão, especialmente votações, nesta Casa, além das sessões, venham a ser abertas. O Parlamento é uma instância de representação da sociedade. É inconcebível que possamos ter uma votação onde 43 Senadores anunciam uma atitude e o painel só registra 35 votos. Isso fragiliza a representação, a democracia e não permite ao eleitor se identificar ou não com a votação de quem a tenha feito.

Por isso, o Senador Tião Viana já teve uma proposta recusada neste Plenário, que nós defendemos no início da legislatura. O Senador Paulo Paim tem uma proposta de transparência em todas as votações para qualquer votação do Senado Federal. E acho que deveríamos dar prioridade absoluta à tramitação desta matéria, para que possamos dar um salto de qualidade em toda essa construção da transparência que é indispensável para uma instância de representação, como o Senado Federal.

Em segundo lugar, quero encaminhar uma proposta à reunião do Conselho de Ética, que acontecerá amanhã. Fiz primeiro essa proposta no âmbito da minha Bancada há algum tempo. Houve simpatia, mas a Bancada mostrava uma certa cautela quanto à viabilidade e oportunidade de apresentação do encaminhamento.

Naquela sessão secreta, onde publicaram inclusive que fiz veemente discurso sendo que eu não tive oportunidade de falar, eu queria apresentar essa proposta. Consegui a assinatura de alguns Parlamentares,mas não encontrei um ambiente oportuno, dado o momento difícil que atravessávamos. Mas hoje quero recolocar e fundamentar a minha proposta. A minha sugestão é a de que adiássemos aquela votação e fizéssemos, nesse processo, um único encaminhamento. Acho que essa construção de fatiarmos as representações e votarmos isoladamente traz um recorrente desgaste institucional e não permite, a quem está na função judicante de julgar, uma visão abrangente, acabada e conclusiva do processo.

Amanhã, votaremos, no Conselho de Ética, o caso Schincariol.

Pergunto ao Senado Federal: Será que a sociedade vai conseguir entender que o mesmo Senador que na semana passada votou pela cassação do Senador Renan Calheiros, no Conselho de Ética, possa, amanhã, votar pelo arquivamento dessa denúncia, mesmo que ela não seja procedente? Não geraremos mais um fato de desgaste e de incompreensão do que realmente estamos encaminhando? Ao contrário do que foi dito, esse não é um julgamento eminentemente político. Ele é político; é essencialmente político, mas não é exclusivamente político.

Eu concordo com a reflexão do Senador Marco Maciel quando diz que essa é uma questão política que tem uma cláusula pétrea, o Pacto Federativo, que reza que a nossa tarefa fundamental é preservar o Senado. Mas é também uma cláusula pétrea as garantias e direitos individuais, que estão presentes nesse processo. Nessa dimensão, o processo jurídico é indispensável.

Por isso, qual o dilema do Senado neste momento? Estamos julgando um mandato, mas estamos analisando quatro representações.

O posicionamento de cada Senador tem de ser, em última instância, o posicionamento em relação ao mandato, mesmo que ele possa, em determinada representação, não concordar, ou concordar, ou propor a cassação ou o arquivamento. O que interessa à República, ao Senado é o julgamento final desse processo sobre o conjunto de indícios, de denúncias, de provas e do processo de defesa que foi apresentado.

Por isso, a minha sugestão para amanhã é a de que o Conselho de Ética suste a representação, que o Presidente, preferencialmente, nomeie três relatores para as três representações que amanhã a Mesa do Senado irá julgar se acolhe. Acolhida a terceira representação, os três relatores indicados - e que eles trabalhem paralelamente durante o período e com um cronograma unificado - apresentem ao Conselho e à sociedade cada um seu relatório a partir desse período previamente estabelecido, e que o Conselho vote as três representações e depois, numa sessão, o Senado vote as três representações, de preferência, numa única sessão e, de preferência, num único dia, para que o Senado dê uma resposta definitiva a esse episódio.

Vou insistir: acho que será incompreensível para a sociedade se nós continuarmos votando separada e fatiadamente essa questão.

Acho que sustar a votação é indispensável para que possamos concluir a análise e votar integral e acabadamente tudo que já foi apresentado em relação a essa denúncia.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite, Senador Aloizio Mercadante?

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Pois não, Senador Eduardo Suplicy.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Senador Aloizio Mercadante, V. Exª coloca aqui alguns pontos que são de grande importância, inclusive para que o Senado Federal, que esteve sob a atenção tão grande da opinião pública, do povo brasileiro na última semana, possa realmente refletir sobre tudo que aconteceu e tomar as medidas necessárias para tornar a nossa instituição mais transparente, mais forte e com decisões que possam ser respeitadas pelo povo brasileiro. Então, apóio a conclamação de V. Exª para que votemos, o quanto antes, o projeto de resolução que torne abertas as sessões que sejam de natureza tais como as da semana passada para a votação de cassação de mandato de um colega, de um Senador. Felizmente, o Senador Sérgio Zambiasi acaba de me mostrar que já tem praticamente a assinatura de todos os Líderes para que venhamos a votar o projeto de resolução sobre o assunto, em regime de urgência, possivelmente de hoje para amanhã. Em segundo lugar, comungo com V. Exª o sentimento de que o Senado deve continuar a existir e que, se porventura tem havido problemas em nossa Casa, possamos todos nos empenhar para que o Senado Federal - que muitas vezes tem tomado decisões importantes para a população brasileira, por vezes de maneira mais progressista e avançada do que a própria Câmara - possa continuar a dar uma contribuição muito significativa. Aproveito a oportunidade para lhe dizer que, se V. Exª foi responsável pela minha indicação como Relator do Projeto de Licitações, por exemplo, neste caso, está um exemplo de como o Senado Federal dará uma contribuição muito significativa em relação ao que a Câmara dos Deputados aprovou.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço, Senador.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Finalmente, também estou de acordo com a proposição de apreciarmos as três outras representações sobre o caso do Senador Renan Calheiros, para que, então, decidamos em conjunto sobre as mesmas.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço, Senador Eduardo Suplicy.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Senador Aloizio Mercadante, quero apenas pedir aos aparteantes que estejam dentro do tempo regimental, para não prejudicar o tempo do orador na tribuna e pelo número de oradores inscritos a seguir.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Renato Casagrande.

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Muito obrigado, Senador Aloizio Mercadante. Concordo com que deveríamos, nesta semana, desenvolver aqui, no Senado, o primeiro aperfeiçoamento da nossa instituição, que V. Exª defendeu no início do seu pronunciamento, que é o fim da sessão secreta. Isso é fácil de se fazer, é uma alteração regimental. Deveríamos fazê-la rapidamente. O Senador Tião Viana tem conduzido o Senado Federal na ausência do Senador Renan Calheiros. O Senador Renan Calheiros já disse que não conduzirá assuntos do seu interesse. Como isso pode ser do interesse do Senador Renan Calheiros, então, o Senador Tião Viana deveria, de fato, agendar e pautar essa matéria o mais rapidamente possível, porque essa seria uma ação importante para o Senado. Em relação à outra questão, Senador Aloizio Mercadante, tenho defendido que possamos, amanhã, sobrestar a votação do relatório ou da posição do Senador João Pedro, porque a Câmara dos Deputados está fazendo uma investigação e deveríamos, primeiro, verificar qual é o resultado dessa investigação, para depois nos posicionarmos. Porém, não vejo distância grande entre aquilo que eu imaginava e imagino, em termos de uma representação, com relação às outras duas representações.

Não [SF1] sei se é possível votarmos e fazermos o processo de investigação no mesmo tempo das duas representações. Mas, definirmos rapidamente os dois outros relatores para que possamos agilizar o processo de investigação, se for o caso, e agilizarmos as votações, penso que tem a concordância e a unanimidade no Senado. Então faço coro de que devamos ter rapidez no processo de investigação e de conclusão desses processos, para que possamos voltar à normalidade no Senado.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço, Senador Renato Casagrande, porque, se, de fato, for votada amanhã a representação do Conselho de Ética e marcada uma nova sessão e se, de fato, procede a manifestação de Lideranças importantes desta Casa, publicadas na imprensa - Senador Arthur Virgílio, Senador Demóstenes Torres, Senador João Pedro -, sugerindo arquivamento, ou levantando a hipótese do arquivamento, ou, pelo menos, discutindo que essas Lideranças poderiam estar pensando na hipótese do arquivamento, penso que nós vamos cometer um segundo erro político.

Eu, se, de fato, for apresentado ao Plenário o arquivamento, provavelmente, abster-me-ei novamente e vou sustar o meu voto. Por quê? Porque cada representação dessa está permitindo que possamos fazer uma convicção - alguns já têm uma convicção firmada e definitiva sobre o episódio. Ora, se já possuem uma convicção firmada, como é que amanhã pode votar em arquivamento de uma denúncia quando já se votou na cassação do mandato do Senador? Isso é absolutamente injustificável, insustentável. Não possui racionalidade.

O que tentei fazer antes da sessão, faço agora, de forma pública e transparente, demonstrando que, se aguardarmos a análise das quatro representações, cada Senadora terá um julgamento final da defesa e da acusação e expressará o voto de mérito de forma terminativa: cassa ou não o mandato do Senador Renan Calheiros.

Se nós fatiarmos e votarmos esse processo sem nenhuma racionalidade, articulação ou entendimento, continuaremos aprofundando as dificuldades do Senado Federal, porque estaremos julgando um Senador e não cada representação. As representações são parte de uma mesma denúncia. São momentos de um mesmo mandato ou não, que podem ou não ser verdadeiros.

Por isso, meu voto não foi de omissão como alguns disseram. Foi um voto transparente e de quem entende que o julgamento de mérito se faz com base na conclusão do processo, ouvindo o direito de defesa até o último momento. São prerrogativas fundamentais do Estado de direito democrático. Eu darei o meu voto de mérito, como disse que faria, com toda a transparência e publicamente, quando terminar a minha convicção, ouvir as quatro representações, a natureza da acusação e da denúncia e o que representa esse julgamento final.

Lamento que, quando eu tentava, na sessão, articular essa proposta de adiamento de uma votação conjunta, se tenha divulgado que o meu esforço era negociar emenda - nunca fiz isso nesta Casa nem quando era Líder do Governo - ou então construir votos favoráveis à abstenção. Nunca tratei com quem quer que seja neste plenário como votaria. Nunca perguntei, indiquei ou sugeri. O que tentei defender é essa convicção que expresso hoje aqui de forma transparente e pública, mas que não foi possível.

Devemos analisar as três representações que faltam e oferecer aos Senadores um relatório completo para que cada um forme definitivamente seu julgamento de mérito e expresse numa votação a cassação ou não do mandato. Para mim, esse seria o melhor encaminhamento desse processo. Portanto, Senador João Pedro, a minha sugestão a V. Exª é que defenda essa posição no Conselho de Ética. É um equívoco V. Exª propor o arquivamento de uma denúncia isoladamente.

Isso não ajuda no processo e impedirá que o Senado possa permitir que cada Senador conclua a sua análise e o seu voto de convicção ao final dessa investigação.

Senador João Pedro.

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Senador Mercadante, rapidamente, dez segundos por favor, Senador João Pedro. Há só uma divergência entre o pensamento de V. Exª e a minha posição, que até gostaria de deixar bastante clara. Eu não discordo e não rejeito a unificação e a avaliação desse processo, tanto é que estou propondo sobrestar para que a Câmara possa continuar a investigação. A minha única discordância de V. Exª com relação ao processo de primeira representação é com a formação de convicção, no mérito. Pelo nosso trabalho, o meu e o da Senadora Marisa Serrano, estamos convencidos da quebra do decoro parlamentar independentemente de outras representações e de outros possíveis indícios. Já tínhamos esse convencimento, tanto é que propusemos o parecer ao Plenário do Senado.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Renato Casagrande, eu não tenho duvida de que foi pela convicção e pela consistência do relatório. Por isso mesmo, entendo aqueles que formaram a sua convicção e já definiram seu voto pela cassação, mas não concordo com a votação pelo arquivamento da matéria porque, ainda que eu possa considerar que ali não há uma conclusão sobre a tese fundamental de origem da representação de que foi a empreiteira que pagou os gastos pessoas do Senador Renan Calheiros, na defesa do Senador ficaram mais dúvidas do que certezas. E várias questões que estão ali podem desaparecer do processo de análise que cada um fará ao final do processo, tanto naquela denúncia, quanto naquela que, amanhã, será sugerida, tanto a acusação quanto a defesa fazem parte da convicção de uma decisão que temos que tomar: cassar ou não o mandato do Senador Renan Calheiros.

O que quero mostrar é a contradição. Amanhã, o Senado poderá estar mergulhado... Como explicar o fato de aqueles que declararam e votaram pela cassação da representação anteriormente, eventualmente proponham e defendam o arquivamento da matéria amanhã, se se trata do mesmo Senador e do mesmo mandato? Por isso, insisti que era importante construir essa mediação, para fazermos a análise de todas as representações e votarmos separadamente, e preferencialmente, numa única sessão no Conselho e numa única sessão no Senado.

E propus ao Senador João Pedro, pelo respeito que tenho e pela convicção que já mostrou por meio no voto dele, em que sugeriu e votou pela cassação do mandato, que ele não tem a possibilidade de encaminhar de outra forma, na medida em que já manifestou a sua posição fundamental. Por isso, ele pode oferecer o relatório do caso Schincariol juntamente com as demais representações que serão apresentadas. E que possamos votar todas elas em uma única oportunidade, concluindo esse processo com todos os elementos que os Senadores terão de defesa e de acusação em relação ao Senador.

Senadora Ideli Salvatti, Senador João Pedro.

A SRA. IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Senador Aloizo Mercadante, quando V. Exª, na semana passada, praticamente às vésperas da sessão da quarta-feira, trouxe-me essa análise e encaminhamento, fui muito sincera com V. Exª.

Eu entendia que era um encaminhamento adequado, mas absolutamente impossível de ser implementado, devido o acirramento no Senado da República. Depois do episódio de quarta-feira passada, o resultado do voto deste Plenário permite que, frente às representações restantes, possamos dar, agora sim, de forma antecipada, num conjunto de medidas que precisam ser adotadas amanhã na reunião do próprio Conselho de Ética, como a Bancada do PT firmou hoje, por unanimidade de todos os seus membros, que vamos fazer o encaminhamento no sentido de que não haja o fatiamento e possamos ter um conjunto de análises dos relatórios, de avaliação, para que o Plenário possa, de uma vez por todas, com o painel todo pronto, montado, deliberar e julgar se houve ou se não houve quebra de decoro parlamentar. Até porque V. Exª diz corretamente que não estamos julgando uma representação, cada uma delas, mas estamos julgando o mandato de um Senador, que, no caso e ao mesmo tempo, este Senador ocupa nada mais nada menos que a chefia de um Poder. Ao ocupar a chefia de um Poder, traz elementos para o julgamento que não estariam colocados no julgamento de outros mandatos. Tive a oportunidade, inclusive, no meu pronunciamento na sessão, de expressar isso de forma muito clara: que me sentia muito incomodada de estar participando de um julgamento e que do resultado desse julgamento poderíamos estar ou não abrindo um processo sucessório da chefia de um Poder.

Era impossível imaginar que pudéssemos ter isenção e imparcialidade, total e absoluta num processo como esse. Por isso, acho que está correto não termos o fatiamento. Vamos trabalhar para termos uma avaliação única, mesmo que sejam vários relatórios, até porque, nesta correlação de forças tão próximas e sempre difíceis de serem conduzidas no Senado, precisamos trabalhar para que o processo seja legítimo, legal, justo e para que, conforme nós aprovamos na reforma do Judiciário, garantamos sempre procedimentos que assegurem a celeridade da tramitação. Imagine o que seria para cada representação vivenciarmos vários processos iguais ao que vivenciamos na semana passada. Por isso, está correto o encaminhamento feito agora, porque agora é possível construir, é possível convencer todas as Lideranças amanhã no Conselho de Ética de termos este processo como um todo e não fatiado.

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Senador Mercadante, peço um aparte.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Pois não, Senador. Só para concluir, gostaria de dizer que uma das questões que me levantaram é o questionamento sobre por que não fiz antes essa proposta. Não fiz antes porque não cheguei a essa conclusão antes. Se tivesse tido espaço para ouvir e debater com racionalidade e com argumentos, seguramente poderíamos ter tido uma resposta melhor.

Espero sinceramente, Senador José Nery, que amanhã o Conselho de Ética possa encaminhar uma análise articulada dentro de um prazo. Cada representação tem que ter um rito e um relator. Mas que se faça um cronograma conjunto, um trabalho paralelo para acelerar o processo e que se apresente esse resultado final a todos os Senadores, para que cada um possa, a partir dessa análise, fazer seu julgamento terminativo e definitivo.

Concedo um aparte ao Senador José Nery.

O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Senador Aloizio Mercadante, Srªs e Srs. Senadores, estamos convivendo hoje, aqui no Senado, com quatro representações contra o Senador Renan Calheiros: uma delas já processada e julgada pelo Plenário na quarta-feira passada; outras duas remetidas ao Conselho de Ética; e uma quarta que aguarda a decisão da Mesa. Queria lembrar a todos que esse fatiamento de representações ocorreu porque o Conselho de Ética assim o quis. Logo que surgiu a segunda denúncia, que tentamos fazer sob a forma de aditamento ao Conselho de Ética, o Conselho nos respondeu que não seria possível. O nosso entendimento, desde o início, é de que todas as denúncias que envolvem o mesmo Senador tratam-se todas, segundo avaliação do PSOL, de uma possível quebra de decoro parlamentar. Logo, esse conjunto de denúncias poderia ser agregado em um único processo. Ficou fatiado dessa forma, em um conjunto de representações, porque o Conselho assim o quis, assim orientou.

Nesse sentido quero fazer uma proposta, proposta, aliás, que foi resultado de uma reunião realizada na semana passada, na quinta-feira passada, com as Lideranças dos vários Partidos. A proposta é para que os diversos Partidos e as diversas Lideranças façam um requerimento conjunto, para juntarmos em um único processo todas as denúncias. Seria um acordo feito no âmbito do Conselho de Ética com todas as Lideranças partidárias, para que a representação número dois e a representação número três e também a representação número quatro, se for aceita, uma vez que ainda será despachada pela Mesa, sejam reunidas num único processo e que seja constituída uma comissão de relatores, tal qual fizemos em relação ao processo número um, uma comissão processante. Creio que, com isso, poderíamos adotar todos os procedimentos investigatórios com celeridade, seguindo todas as etapas que um processo dessa natureza requer. E, ao final, teríamos condições de elaborar um juízo de valor e um julgamento concreto, sério, honesto e correto sob o ponto de vista processual. Ao final dele, seja pela absolvição, seja pela cassação nesse outro conjunto de processo, nós poderíamos fazer um encaminhamento com economia processual e com celeridade, porém, sem atropelar prazos e a necessidade de uma boa investigação. O importante é que, ao final, estejamos nós convencidos de que procedemos da melhor forma para respeitar o interesse da sociedade brasileira e o interesse do Senado, daqueles membros do Senado que realmente querem apurar e chegar à conclusão de um processo tão rumoroso e tão difícil. Muito obrigado a V. Exª.

ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - É uma honra. Eu só queria ponderar. Se for possível regimentalmente aditar - e não sei se é essa a interpretação do Conselho -, se faz por aditamento. Não sendo possível por aditamento, se faz no cronograma... Faz-se uma comissão de três, trabalhando de forma sincronizada e articulada, e um processo de votação integrado para evitar esse encaminhamento que nós temos tido até o momento.

Senador João Pedro, para concluir.

O SR. JOÃO PEDRO (Bloco/PT - AM) - Senador Mercadante, em primeiro lugar, faço este aparte para refletir sobre aquela sessão secreta que, eu espero, seja a última sessão secreta da história do Senado da República, até porque nosso Partido tem uma história aqui no Senado de defesa do voto aberto. Em segundo lugar, presto minha solidariedade a V. Exª, dizendo, ao mesmo tempo, que nesse contexto de crise por que passa o Senado da República, neste debate acalorado que nós estamos travando, debate esse que está sendo acompanhado pela opinião pública nacional, que V. Exª tem uma postura de homem público. Grande parte dos assuntos tratados na sessão secreta tornou-se pública. E a postura de V. Exª, na sessão secreta, engrandece sua vida pública como dirigente do PT, como dirigente político no seu Estado, como Senador cuja vida é dedicada às questões do nosso País, do nosso Governo e do Partido dos Trabalhadores.

V[P2] . Exª tem tido uma postura exemplar. Quero lembrar que, ao tentar falar na sessão e expor suas idéias, não pôde. E V. Exª, aliás, não falou nem andou atrás de votos. É preciso que o Brasil, que ouve e acompanha o pronunciamento de V. Exª, reflita acerca de sua postura. Não pode haver dúvidas. V. Exª é um político que engrandece a história do meu Partido e, com certeza, da política nacional.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço, Senador João Pedro. Só queria terminar, Senador Antonio Carlos Valadares...

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (Bloco/PTB - RS) - Peço a palavra, Senador Aloizio Mercadante.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Pois não, Senador Sérgio Zambiasi.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (Bloco/PTB - RS) - Com a compreensão do Presidente Valadares, quero comunicar a V. Exª à Casa e a quem nos está assistindo que contamos com a assinatura dos Senadores João Ribeiro - PR, do Líder do Governo Romero Jucá, do Senador Valdir Raupp, Líder do PMDB, do Senador José Agripino, Líder dos Democratas, do Senador Arthur Virgílio, Líder do PSDB, da Senadora Ideli Salvatti, Líder do PT, do Senador Epitácio Cafeteira, Líder do PTB, do Senador Jefferson Péres, Líder do PDT, do Senador Renato Casagrande, Líder do PSB, do Senador João Ribeiro, como citei agora, do PR, do Senador Marcelo Crivella, do PRB, do Senador José Nery, do PSOL, do Senador Francisco Dornelles, do PP e do Senador Inácio Arruda - que já nos autorizou a comunicar a sua adesão. Recolhemos, portanto, assinaturas de todos os Líderes, à exceção do Senador Inácio, que não está presente neste momento, mas chegará logo mais para assinar. Estamos, portanto, recolhendo a unanimidade das assinaturas dos Líderes para a apresentação e apreciação para a apresentação e apreciação, portanto, a colocação na Ordem do Dia do Projeto de Resolução do Senado nº 55, de 2007, de autoria dos Senadores Suplicy e Delcídio Amaral, que dá nova redação à alínea c do inciso I do art. 197 do Regimento Interno do Senado Federal, que retira a obrigatoriedade de ser secreta a sessão destinada a apreciar perda de mandato de senador. Estamos, portanto, apresentando com a assinatura e o apoio unânime desta Casa.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Queria, Senador Zambiasi, parabenizar V. Exª.

Comecei exatamente por esse ponto meu pronunciamento formalizando esse encaminhamento e fico muito feliz que já tenha sido materializado. Espero que possamos votar hoje, nesta sessão, como primeiro item da pauta, esse projeto que torna todas as sessões do Senado Federal definitivamente públicas.

Ao terminar, Senador Antonio Carlos Valadares, gostaria de dizer pessoalmente ao Senador Renan Calheiros, não tive oportunidade - a ele pessoalmente disse, mas publicamente não tive essa oportunidade -, mas agora quero expressar da tribuna do Senado que acho que o melhor para o Senador Federal, o melhor para o momento que atravessamos e o melhor para a própria defesa do Senador Renan Calheiros é que ele se licencie da Presidência do Senado até que seja concluído todo o processo de apuração que está em curso no Conselho de Ética.

Sei que vários Senadores já fizeram essa manifestação pública da tribuna, cada um com seu estilo, com a sua veemência, com a sua argumentação, mas acho imprescindível, sempre achei, disse reservadamente tantas vezes a ele, mas hoje me associo a todos que pensam dessa forma. Acho que o Senado precisa desse gesto. E ele deveria escolher esse caminho da sua defesa. A um só tempo, ele teria melhores condições para se defender, e o Senado Federal, melhores condições para evoluir na sua agenda, com tantos desafios que tem, neste momento, diante de si.

Por isso, formalizo aqui essa recomendação, que me parece absolutamente inadiável.

Agradeço a gentileza da Mesa pelo tempo.

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. Bloco/PSB - SE) - Concedo a palavra ao próximo orador inscrito, pela Liderança do DEM, Senador José Agripino.

Em seguida, pela lista de oradores, concedo a palavra ao Senador Raimundo Colombo.

De:

assessoria@mercadante.com.br

Para:

corivalcarmo@yahoo.com

Assunto:

Razões do voto do Senador Mercadante

Data:

Fri, 14 Sep 2007 10:54:24 -0300

Prezado Senhor Corival Alves

Cordiais Saudações

Razões do meu voto

“Os juízes devem ser homens de Estado. É necessário que saibam discernir o espírito de seu tempo, afrontar obstáculos que é possível vencer e desviar-se da corrente, quando o turbilhão ameaça arrastar, junto com eles mesmos, a soberania da União e a obediência devida a suas leis”. Tocqueville

Percebo e compreendo o sentimento da sociedade, que quer a cassação do Senador Renan Calheiros. Ao longo de mais de 100 dias, diante de tudo o que foi publicado, verdade ou não, é natural que seja essa a vontade e a conclusão das pessoas. Trata-se de um julgamento que não apresenta grandes dificuldades, feito ao sabor da percepção dos acontecimentos veiculados pela mídia.

De minha parte, também seria mais fácil me esconder no voto secreto, como infelizmente tantos fizeram, sem que ninguém sequer soubesse minha posição, ou simplesmente acompanhar o movimento da sociedade e do eleitor, sem preocupar-me com a imprescindível proteção aos direitos e garantias individuais que julgamentos relativos à cassação requerem. Poderia estar, agora, confortavelmente recebendo elogios de todos.

Não foi essa a minha atitude. Fiz o difícil e o necessário. Naquele momento, eu não era simplesmente um parlamentar, mas um juiz diante de uma decisão que poderia tirar da vida pública por mais de 10 anos um senador eleito com aproximadamente 80% dos votos de seu estado. Tais julgamentos não podem ser fáceis, pois incidem diretamente sobre direitos e garantias individuais.

Porém, alguns argumentam que o julgamento no Senado é eminentemente político e não precisa ter o rigor e nem o tempo dos julgamentos jurídicos. Não é verdade. É óbvio que todo processo dessa natureza tem como pano de fundo uma disputa política, principalmente quando está em jogo a Presidência da Casa. Essa disputa, no entanto, não deve contaminar o processo. Julgamentos políticos são típicos de ditaduras. Numa democracia, quaisquer julgamentos, principalmente aqueles que incidem sobre os direitos e as garantias individuais, têm de respeitar princípios jurídicos universais, como o do devido processo legal, o do amplo direito à defesa e, acima de tudo, o de que o ônus da prova para além da dúvida razoável cabe ao acusador. São exatamente esses aspectos formais do processo que garantem o respeito aos direitos e garantias individuais e a lisura dos julgamentos. Não fosse desse modo, os julgamentos seriam, aí sim, meras formalidades.

Coerentemente com esses princípios e preocupado com o desgaste do Senado, defendi na sessão que fosse adiada a decisão, por considerar que não havia ainda no processo provas conclusivas de que os pagamentos à Sra. Mônica Veloso foram feitos pela empreiteira à qual era vinculado o lobista amigo de Renan Calheiros, já que a leitura atenta dos pareceres revelava mais indagações do que certezas. Tampouco havia no processo a tão necessária análise das outras acusações que pesam contra o Renan Calheiros, como seu eventual envolvimento com a compra de emissora de rádio por intermédio de laranjas, a possível intervenção indevida e ilegal em favor da cervejaria Schincariol e o noticiado esquema de beneficiamento de instituição bancária para atuar com créditos consignados. Assim, era impossível, naquele momento e com as informações disponíveis, emitir um juízo de valor conclusivo sobre a culpa do Senador Calheiros.

Considerei, por outro lado, que também não era possível inocentá-lo em definitivo, pois há indícios de crime tributário, que só serão configurados após a devida investigação pela Receita Federal. Outra frente de investigação também está em andamento no Ministério Público Federal, já autorizada pelo Supremo Tribunal Federal, que tem demonstrado extremo rigor na análise de processos que envolvam parlamentares.

Ante a impossibilidade do adiamento da decisão, vi-me num dilema ético. O voto “sim” significava a culpa comprovada acima de quaisquer dúvidas e a cassação. O voto “não”, por seu turno, significava o reconhecimento de uma inocência ainda em questão e o arquivamento do processo. Optei, dessa maneira, pela abstenção. Portanto, não dei esse voto por falta de convicções, mas porque acreditava e continuo a acreditar que todos os processos abertos no Conselho de Ética devam seguir com rigor, até que se possa fazer um julgamento final e conclusivo sobre todas as acusações. Defendo, inclusive, que o Senador Renan Calheiros deva licenciar-se da Presidência do Senado, de forma a assegurar que os processos transcorram com isenção e sem percalços de qualquer tipo.

Não foi uma decisão fácil. Tive de abstrair meus interesses políticos e eleitorais e repelir a sedução do aplauso da opinião pública. Tampouco foi uma decisão coletiva, pois, ao contrário do que foi noticiado de forma maliciosa, não solicitei voto a ninguém e respeitei as convicções de todos.

Foi uma decisão difícil e solitária e o meu voto foi o voto do magistrado que busca pesar cuidadosamente todos os aspectos jurídicos do processo na balança da Justiça e que se rege por lógica e tempo obviamente distintos daqueles utilizados pela mídia.

Estou, é certo, pagando um preço político e pessoal caro por ter tomado essa decisão e não peço que concordem com ela. Mas quero que compreendam que foi uma decisão tomada com transparência e com base em princípios e convicções. Poderia, é claro, ter tomado outra decisão com base apenas nas minhas conveniências políticas e eleitorais. Porém, nesse caso, eu teria de pagar um preço terrível: o preço daqueles que votam contra suas convicções.

E esse preço, podem acreditar, eu não poderia jamais pagar.

Senador Aloizio Mercadante.