"Desde mi punto de vista –y esto puede ser algo profético y paradójico a la vez– Estados Unidos está mucho peor que América Latina. Porque Estados Unidos tiene una solución, pero en mi opinión, es una mala solución, tanto para ellos como para el mundo en general. En cambio, en América Latina no hay soluciones, sólo problemas; pero por más doloroso que sea, es mejor tener problemas que tener una mala solución para el futuro de la historia."

Ignácio Ellacuría


O que iremos fazer hoje, Cérebro?

domingo, 9 de setembro de 2007

Grito dos excluídos

Sexta-feira, 7:00hs da manhã estava na Catedral da Sé para para assistir a missa do Grito dos excluídos e a manifestação na seqüência. Então vamos às considerações:
1. Quando a missa começou e até a metade a Catedral estava praticamente vazia. Depois encheu, mas não lotou. Os Arautos do Evangelho colocam mais gente nos primeiros sábados do mês nos atos em desagravo a Nossa Senhora e ao Sagrado Coração de Jesus. Depois, da missa havia muito mais gente na manifestação. Comentarei depois.
2. Obviamente não esperava ver Arautos do Evangelho no local, mas havia poucos organizações religiosas identificáveis, a maioria franciscanos, inclusive a Toca de Assis. Não esperava ver ninguém da Toca de Assis já que são ligados ao movimento carismático, entretanto havia poucos se compararmos com a quantidade que circula pela região da Sé, mas estavam lá e participaram do famigerado plebiscito sobre a Vale.
3. A privatização da Companhia Vale do Rio Doce foi um erro, boa parte dos problemas que surgiram no Norte do país e descambaram para uma violência aberta decorrem desta privatização. Mas o erro já foi cometido. Os erros em geral só podem ser consertados levando-os adiante e não tentando retornar ao período anterior ao erro. Não se volta ao passado, estatizar a Vale não conserta os problemas gerados pela privatização, mas gera novos problemas. Há portanto objetivos mais importantes e mais exeqüíveis para se lutar no curto prazo há outros setores que poderiam ser estatizados ou desenvolvidos pelo Estado antes. Sinceramente, gostaria de conseguir entrar na cabeça daqueles que propuseram um plebiscito sobre a Vale para para entender de onde sai uma idéia estapafúrdia dessas, com base no que se pensa isso e especialmente se é sincero. Dizem que os sábios são os grandes incompreendidos, eu sinceramente tenho mais dificuldade para entender a ignorância.
4. Não havia nenhuma bandeira do PT. Mas o PT estava lá na linguagem da Pastoral Operária, no tratamento companheiro/companheira. A Igreja se equivoca nesse momento, se quer uma grande mobilização deveria mobilizar pela fé, não pela posição política e pela consciência política. O tratamento companheiro/companheira segrega e divide e desmobiliza os que poderiam ser motivados a participar pela fé. A Igreja progressista incorporou um erro geral da esquerda brasileira, não busca vínculo de fato com o povo, tenta é fazer o movimento inverso absorver o povo em valores e idéias que lhe são estranhas.
5. Um exemplo de como a esquerda não entende o povo brasileiro está em um dos folhetos que recebi do intitulado Partido Operário Revolucionário, nunca tinha ouvido falar e não perdi meu tempo consultando o site do TSE para saber se ele existe de direito. O POR se intitula "um partido de quadros, marxista-leninista-trotskista e membro do Comitê de Enlace pela Reconstrução da IV Internacional e o informativo deles é denominado "Massas". Analisemos as informações, primeiro partido de quadros não é uma expressão que devesse ser usada, porque significa um partido controlado pela cúpula, e um partido que tem um informativo chamado massas provavelmente não quer isso. Reconstrução da IV Internacional? Uma pessoa em condição intelectual normal não diz uma bobagem dessas, a IV Internacional na maior parte do tempo foi uma ficção. Pior, alguém acredita que algum partido político consegue se identificar com o povo brasileiro falando em nome da IV Internacional e se auto-denominando marxista-leninista-trotskista? Se eu tenho dificuldade de entender o que é uma partido marxista-leninista-trotskista, imaginem o povo.
6. Outra demonstração da distância entre o povo e a esquerda era a presença do PSOL, descobri que o PSOL tem militantes muito bonitas, mas que para parecerem com o povo precisam se vestir mal, acham que ser de esquerda é vestir-se como hippie. Ou seja, estão muito distantes do povo, idealizam o povo, são jovens de classe média que pensam que sabem o que o povo quer e mais acreditam que fazer parte do povo é um modo de se vestir, e não um modo de ser e pensar. De fato a esquerda agride o povo e violenta o povo quando se apresenta desta forma falsa, sendo que todos sabem que para o povo o seu modo de ser decorre da opressão, enquanto para a maioria dos militantes de esquerda não passa no máximo de uma forma de expiação, que tem data marcada para encerrar. E máximo que conseguem se igualar ao povo é em relação às roupas, porque no demais o estilo de vida da classe média, classe média alta é mantida. A balada do militante do PSOL não é a balada do povo. É uma pena.
7. A imprensa é nojenta. Havia logo na primeira fila da Igreja um morador de rua e obviamente comportando-se como morador de rua, a imprensa não parava de fotografar e filmar o coitado mesmo que tentando disfarçar um pouco para ele não se revoltar. Pela imprensa o povo é tratado como um animal no zoológico. Um dos padres (um franciscano) que estava celebrando a missa foi o único que de fato o tratou como uma pessoal normal, inclusive abraçando-o.
8. Criança é sacanagem. Houve uma apresentação músicas cantadas em guarani por crianças de uma tribo da região de Brasilândia ou algo assim. Colocando crianças lá quase me convencem do preservacionismo. No entanto, não é possível preservar as culturas indígenas e nem é correto obrigar os índios a viverem no seu modo de vida tradicional. Veja que quanto mais tentam conservá-los, mais pobres ficam. Os indígenas precisam ser tirados da pobreza e por isso precisam abandonar o seu modo de vida tradicional e devem poder escolher isso. Abandonar o modo de vida tradicional não significa abandonar a cultura indígena. Se se incorporar a outras civilizações significasse abandonar a sua própria cultura não haveria um judeu na face da terra, o judaísmo sobreviveu ao império romano, ao cristianismo. Se para preservar a cultura fosse necessário manter o isolamento, os ciganos teriam desaparecido há alguns séculos. É preciso que os indígenas se incorporem, caso queiram, e com condições de conservar a sua cultura. E os índios que quiserem manter o modo tradicional de vida? Que mantenham enquanto eles entenderem que isso é o melhor e é possível. No entanto, exceto nas tribos perdidas no meio da Amazônia que nunca entraram em contato com o homem branco isso é possível. Ora em contato com o mundo do dinheiro os índios desejarão o dinheiro, e aí o preservacionismo não passa de um mito, se a sobrevivência da tribo tiver que passar por relações mercantis significa que a cultura e modo de vida tradicional já foram destruídos e que não há nada a ser preservado. É difícil ser racional quando se vê crianças pedindo para que a sua cultura seja salva, mas quando se olha para elas se vê também que a primeira coisa da qual precisam ser salvas é da pobreza.
9. Os progressistas, provavelmente irão odiar o comentário, mas a missa parecia missa carismática com a diferença que a catarse não se dava pela ação do espírito santo, mas pelos hinos mobilizadores.
10. Padres devem se vestir de padres, porque isso aumenta a mobilização pelas razões apenas religiosas e, porque, eles não são iguais ao povo e não devem sê-lo sob o risco da irrelevância. Depois da missa, eu fiquei num canto na porta da catedral, onde pensei que poderia acompanhar a movimentação tranquilamente sem ser perturbado. Logo veio para o meu lado, um senhor baixinho, gordo, queimado de sol, já envelhecido, com um chapéu de fazendeiro já meio desgastado. E eu nem dei bola pra ele, continuei observando. Aí alguém brinca com ele, por causa do chapéu, se ele tinha mudado de lado, e outro faz a mesma piada besta, até que um outro vai fazer a mesma piada e diz pra um terceiro olha aí o nosso bispo passou para o outro lado. O sujeito ao meu lado era o bispo da Diocese de Santo André. Não havia nada, absolutamente nada nele que o identificasse como bispo, nem mesmo como um religioso. Ao fazer isso, ele aboliu o caráter mobilizador da religião, quem o seguiria por ser ele o bispo vai deixar de fazê-lo e ao mesmo tempo não coloca nada no seu lugar, porque ele estava acompanhando o pessoal da Pastoral Operária que não saia do companheiro/companheira. Exceto alguns franciscanos que vestiam os trajes de frades, os demais religiosos e religiosas praticamente não eram identificáveis, havia até monges beneditinos que de monge ali não tinham nada. Não pode ser assim, está errado, inclusive por razões bastante terrenas e políticas.
11. Além de se vestir como religiosos, os padres precisam ter mentalidade religiosa mesmo sendo progressista. Um dos padres que estavam lá no altar parecia ser a pessoa mais entediada durante a missa, não só pela cara, mas pelo comportamento, ficar em pé de braços cruzados durante toda a liturgia eucarística não tem cabimento.
12. Os discursos dos representantes dos movimentos sociais foram suficientemente singelos para serem vazios de conteúdo. Mas mostram que a desgraça do mundo moderno é a substituição das classes sociais por outras categorias com interesses apenas parciais. Estavam no mesmo ato, mas cada um ali defendia apenas o seu próprio pão. Óbvio que os organizadores não colaboram colocando a Vale como tema, mas de todo modo a fragmentação hoje parece ser uma tendência irreversível o que faz com que as classes dominantes e o estado estejam sempre mais fortes. A única coisa que une estes movimentos são teses tão genéricas e abstratas que não geram conseqüência, é preciso que a esquerda entende que ser contra o imperialismo não tem significado prático nenhum, porque isso não tem relação com as lutas e o modo de vida do povo.
13. Manifestação que é feita sem o risco da força ser utilizada contra ela é uma manifestação inútil, porque significa que foi aceita pelo poder. O fato do Lula ter mencionado o plebiscito pela estatização da Vale demonstra a fraqueza do movimento.
14. O movimento que mais levou gente foi com certeza a Educafro dos franciscanos. E logo em uma das primeiras faixas se via como precisam de educação neste país, une do verbo unir estava escrito assim Úne.
15. Cantar "eu só peço a deus um pouco de malandragem" só pode ser sacanagem do cantor. primeiro, porque sendo um movimento liderado pela Igreja não deveria cantar isso. Segundo, porque vai exatamente no contrário da lógica da mobilização, que presa pela saída coletiva e não individualista. Terceiro, porque, o problema do Brasil é a malandragem, inclusive do povo.
16. Obviamente cantaram o bom e velho Geraldo Vandré, "Pra não dizer que não falei de flores". Engraçado é que o cantor gritou "Geraldo Vandré vive" e alguém do meu lado gritou de volta "e vive mesmo, ele não morreu não", o que é verdade, ele está vivo. Mas certamente não parece. De todo modo precisamos de novas composições de protesto, e com alguma criatividade. Na verdade, eles distribuíram um folheto com as três músicas mais tocadas nos treze anos de Grito dos Excluídos, a mais tocada é do companheiro Zé Pinto do MST que se chama "Ordem e progresso", colocarei a letra da música em outro post.
17. Tinha um pessoal lá de serviço social com uma citação do código de ética da profissão que dizia que era contra o capitalismo. Se isso for verdade, se houver no código de ética um artigo que manda lutar contra o capitalismo será, com absoluta certeza, o código de ética mais inútil e tosco da história da humanidade, nem o oferecer a outra face defendido por Jesus é tão inútil.
18. Observei umas três horas e meia o movimento, mas obviamente não segui na caminhada da praça da Sé até o Monumento do Ipiranga. Diria que no final saiu umas 3 mil pessoas da Praça da Sé.
19. Todo mundo que acompanha noticiário já viu as manifestações de estudante na Coréia do Sul. Aquilo é manifestação. No Brasil, o pessoal acha que se manifestar é dançar, nunca vi uma coisa destas. Que manifestação é festa. Manifestação não é festa, está mais para marcha militar. Ao povo brasileiro em geral parece faltar a inflexibilidade necessária para mudar o país, diante da primeira ação da polícia aquela manifestação seria dispersada porque o máximo de protesto que o brasileiro se permite é dançar contra. Mobilizar é organizar tropas para luta e para isso precisa não apenas de unidade de objetivos ( o que não existia como já disse), mas também firmeza de caráter para perseverar diante das adversidades e do fracasso. Infelizmente, os brasileiros são incapazes de atuar com radicalidade (nos dois sentidos do termo) e com inflexibilidade.
20. Mais uma vez constatei que não faço parte do povo, não compartilho os problemas do povo. Uma vez um professor da Unicamp disse que ele não tinha nada a dizer sobre o que o povo queria e sobre o que o povo deveria fazer, porque ele não fazia parte do povo, nunca havia sentido fome na vida, de fato ele se orgulhava de ser de família quatrocentona de São paulo e de pagar para a empregada dele de salário um valor superior ao que recebíamos de bolsa de mestrado (na época 724 reais e ele dizia que já pagava mais do que uma bolsa de doutorado que era 1200 reais). Na época achei que era frescura apenas para ser diferente, porque todo intelectual de esquerda se considera um intérprete da vontade e das necessidades do povo. Mas quanto mais eu observo o povo, mais convicto fico que não necessariamente o que acredito ser importante para o país seja importante para o povo brasileiro.
21. A Educafro estava distribuindo um papel com e-mail de jornalistas e redação de jornais e tvs para que as pessoas enviassem mensagem criticando o Inclusp, porque a mídia racista estaria elogiando o programa (que segundo eles é um fracasso) apenas para atacar as políticas de cotas e ação afirmativa. Como sou contra a ação afirmativa e as cotas raciais ( se forem sociais considero um pouco mais aceitável, mas precisa explicar um pouco as coisas para os professores universitários neste caso) não irei mandar nenhum e-mail.
22. Outro problema dos partidos de esquerda lá era querer vender o jornal deles, um monte de gente ia pegar pensando que era de graça e se decepcionava, o do PSOL era dois reais e pouco, um da Causa Operária era R$3,50, decididamente o jornal não era para a classe trabalhadora ou ainda mais para os excluídos.
23. Outro protesto que havia lá era de um carroceiro pedindo que a prefeitura cumprisse a liminar conseguida pelo Ministério público contra a apreensão das carroças dos catadores. O que mostra que ser pobre não é fácil mesmo.
24. A Educafro tinha uma faixa pela implementação da lei 10.639 que eu não fazia idéia do que tratava, o que mostra a inutilidade de se protestar colocando o número de uma lei. Mas agora eu já sei, é sobre a disciplina de História e Cultura Afro-brasileira e Africana em todos os níveis educacionais. Eu só fico pensando em como é que isso diminui o preconceito. E de fato eles contribuíram mais para o Brasil se lutassem para que dentro da disciplina história do Brasil se enfocasse mais aspectos da história dos negros. Fora isso é apenas mais uma disciplina no currículo para ser mal aplicada. E buscando saber o que era cheguei a uma manifesto onde entre outras coisas se pede a implementação desta lei, o interessante são as organizações que assinam, das quais irei mencionar só uma, a Via Campesina. Meu deus, fora dos manifestos de esquerda, a Via Campesina existe? Eu queria saber se esta Via Campesina ainda é maoísta, mas nem irei procurar de medo de descobrir que é e ter que criticar ainda mais a esquerda.
25. Eu juro, eu quero ser de esquerda, mas a esquerda não me ajuda.

Nenhum comentário: