"Desde mi punto de vista –y esto puede ser algo profético y paradójico a la vez– Estados Unidos está mucho peor que América Latina. Porque Estados Unidos tiene una solución, pero en mi opinión, es una mala solución, tanto para ellos como para el mundo en general. En cambio, en América Latina no hay soluciones, sólo problemas; pero por más doloroso que sea, es mejor tener problemas que tener una mala solución para el futuro de la historia."

Ignácio Ellacuría


O que iremos fazer hoje, Cérebro?

sábado, 5 de julho de 2008

O cachorro de Rousseau

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Acabei de ler um livro chamado "O cachorro de Rousseau". Vi o livro anunciado no site da livraria Cultura e acabou que foi irresistível comprar. O livro trata das relações entre Jean-Jacques Rousseau e David Hume. Ou melhor da rápida relação entre os dois. Rousseau, luminar da intelectualidade francesa. Hume, da cultura inglesa, ou melhor, que seria luminar da intelectualidade britânica. Porque na realidade em sua época era bastante questionado e especialmente sofria com o preconceito por ser escocês. Rousseau era célebre, mas não era bem-vindo em nenhum lugar, periodicamente precisa se mudar às pressas devido as perseguições políticas. Ao mesmo tempo Rousseau tinha um temperamento difícil, muito emotivo, sensível, era fácilo magoá-lo. Por outro lado, Hume era considerado uma pessoa afáve, um bom amigo, cordato. Esse temperamento fez com que no período que viveu na França estebelecesse muitos laços com a intelectualidade francesa, fizesse muitos amigos. No fim, Hume era mais respeitado em Paris do que em Londres. Mas Hume estava em Paris como secretário do embaixador britânico na França, então quando houve a troca do embaixador Hume deve que retornar para Londres. E na baggem levou Jean-Jacques Rousseau. Hume não conhecia Rousseau. Na verdade se ofereceu para ajudar Rousseau que estava mais uma vez fugindo por causa dos amigos comuns que mantinham. Inicialmente Hume fciou deslumbrado com Rousseau, depois a convivência diária com as idiossincrasias de Rousseau que dificultam tanto ajudá-lo financeiramente quanto encontrar uma casa para ele foram irritando Hume. No fim o que mais problemas causou foi a mania de perseguição de Rousseau, que passou a identificar em Hume um aliado dos seus inimigos. O principal inimigo de Rousseau era Voltaire, em todos os problemas e percalços via o dedo de Voltaire. Vendo conspirações em toda parte, Rousseau rompe com  Hume. E Hume entra em pânico com medo do que Rousseau pode escrever sobre ele. Ele temia a autobiografia que Rousseau estava escrevendo, a eloqüência de Rousseau pareceria mais persuasiva do que sua análise fria. E por isso, Hume tentará atacar antes publicando um livro sobre os conflitos entre eles. No fim Hume que terá o comportamento irascível, porque Rousseau nada disse sobre ele na sua autobiografia já que ela ficou incabada.

O livro tem um viés pró-Rousseau no conflito. Do ângulo de Hume, o livro poderia chamar-se "O cachorro do Rousseau". Agora o que tem a ver o título com o livro? Rousseau gostava de cachorros, no momento da relação com Hume, ele tinha o Sultan. Mas o título se explica pela concepção de amizade defendida por Rousseau e que era uma dificuldade nos seus relacionamentos e nas ações para ajudá-lo. Para Rousseau, a amizade só pode ser uma relação entre iguais que não pode envolver qualquer relação de dependência entre as partes. Ou seja, ele não poderia aceitar jamais depender fincanceiramente de seus amigos, ainda que eventualmente isso tenha ocorrido. Uma das causas da briga com Hume estava relacionado a uma mentira que foi contada para Rousseau para que ele aceitasse que um coche levasse a sua mudança de Londres para o interior onde ele iria morar. Hume disse para Rousseau que não haveria custos porque o coche estava retornando, então iria fazer o favor levá-lo. Mas de fato foi alugado. Sobre isso quando eles já estavam brigando Rousseau escreveu em uma carta para Hume "As mentiras a que chamamos mentirinhas  são verdadeiras mentiras, porque agir de modo enganoso por interesse próprio ou alheio não é menos injusto do que agir de modo enganoso contra os interesses alheios." Rousseau fazia uma defesa veemente da verdade sempre, e segundo o autor se considerava um apóstolo da verdade. A verdade sempre deve ser proclamada. Para a personalidade de Rousseau a amizade também não poderia ser expresa apenas em atos, mas deveria ser expressa através dos sentimentos, da emoção. Aí foi outro problema com Hume que era considerado por todos um sujeito frio, distante, e portanto incapaz de comprrender a linguagem de Rousseau e se expressar nela. Para outra amiga Rousseau escreveu "O que eu digo raramente tem o sentido habitual, pois é sempre meu coração em comunhão com você, e algum dia talvez você entenda que seu idioma não é o mesmo de outros corações." Isto é um problema sério para os intelectuais dar significado próprio às suas palavras e ações tornando mais difícil a compreensão. Os ritos, as convenções sociais visam facilitar as relações entre pessoas, fazer com que compreendem uma às outras, a criação de uma linguagem própria trava os relacionamentos. Já citei aqui no blog o caso de Lukacs, onde todos que lêem as cartas dele e da mulher que me esqueci o nome percebe que os dois estão fazendo um declaração de amor, mas cada um não lê o outro deste modo por dar significado distintos ao amor. Seja como for, Rousseau idealiza a amizade, espera uma relação de tal profundidade que não consegue encotrá-la jamais. Ao contrário, a idealização perturba as amizades reais por torná-las falsas!

Outras considerações:

1. O livro é um bom retrato das relações entre os grandes intelectuais da época. E meu deus! como gostavam de uma fofoca, de pequenas intrigas. Nada diferente do mundo acadêmico de hoje.

2. As cartas. O livro pode ser escrito em função das cartas trocadas pelos diferentes personagens da época. No futuro os historiadores terão dificuldades de construir um livro semelhante. Vivemos no mundo do efêmero, das relações via e-mail que se apagam. A era do excesso de informações sonegará informações ao historiadores do futuro e isso é lamentável.

3. O tamanho do mundo. Superestimamos as mudanças no mundo. O mundo intelectual do século XVIII era profundamente integrado ainda que pelo correio as idéias, as notícias circulavam rapidamente.

4. Decadência. É nítida a decadência do mundo. Jean-Jacques Rousseau era uma celebridade no século XVIII, os jornais buscavam fofocas sobre a vida dele. Noticiar Rousseau vendia jornal. Hoje as pessoas só querem notícias sobre ex-BBBs. De fato, os intelectuais são desconhecidos. Hoje, para ficar com autores brasileiros, ninguém sabe quem é Celso Furtado, Belluzzo, Maria da Conceição Tavares. Nem meus alunos que deveriam saber.

5. Coerência. Tenho dois alunos que são incutidos com coerência. Buscam coerência. Ficariam surpresos com a incoerência dos dois.

5.1. Primeiro Hume. Hume é o pai do ceticismo. Formulador da célebra questão metodo lógica do problema da indução. Ou seja, a partir da observação não é possível tirar qualquer conclusão. Por exemplo, a frase "o sol nascerá amanhã" é uma frase metodologicamente insustentável, por quê? Porque o indivíduo afirma isso simpesmente pelo fato do sol ter nascido, hoje, ter nascido ontem, e anteontem e assim há vários séculos e milênios. Mas desta observação não sai a conclusão que o sol nascerá amanhã, porque não há relação de causalidade entre o sol nascer hoje e nascer amanhã. Portanto é inconsistente afirmar que o sol nascerá amanhã. E isso significa que todo o conhecimento humano é incerto, não é possível ter certeza sobre nada, porque os fundamentos do conhecimento são frágeis. Ora tudo isso é verdade, mas o que fazer se não se pode afirmar que o sol nascerá amanhã? Isso paraliza completamente o indivíduo. Se todo o conhecimento humano for permanentemente questionado o estrago no mundo é muito maior do que o provocado pela incompetência da Telefônica. E o próprio Hume sabe disso. O resultado é uma cisão entre as suas sobres filosóficas sobre o conhecimento humano e as obras sobre economia, história que precisa aceitar alguma relação de causalidade e a validade do conhecimento. Também do ponto de vista existencial Hume reconhece que o homem não pode viver em dúvida permamente mesmo que esta seja a realidade. Outra contradição de Hume está no seu comportamento, boa parte do ódio que ela passou ter de Rousseau foi por Rousseau apontar as contradições da personalidade de Hume.

5.2. "Por que o amigo da humanidade não pode ser amigo dos homens?" Esta frase foi dita por um dos amigos de Rousseau que imediatamente se tornou seu desafeto. Rousseau, o homem, que inspirou revoluções e movimentos políticos basicamente urbano, era averso às grandes cidades, ou mesmo às cidades, não gostava de aglomerações, preferia viver no campo, isolado. E isolado não era força de expressão sequer tinha interesse em se relacionar co meia dúzia de pessoas de modo permanente. Uma vantagem que ele dizia de ter ido morar na Inglaterra é que os seus vizinhos não falavam francês, ele não falava inglês então não precisava se comunicar. Enfim, o homem da democracia direta, dos conselhos, queria viver só. Isso se reflete, por exemplo, nas perseguições políticas que sofreu, foi mais pelo que publicou do que pela ação. Não foi um conspirador, não foi um revolucionário apesar de apoiar os grupos que defendiam a democratização de Genebra contra a gerontocracia calvinista. A frase é ótima, entretanto, extamente por ser amigo da humanidade que Rousseau não pode ser amigo dos homens, se a humanidade foi pervertida pela sociedade e o progresso, os homens também o foram e não são amigáveis. Entretanto, Rousseau não era o novo homem da sua própria utopia, e ele sabia disso, mas daí não concluía que este homem era impossível. Mas que para este homem surgir deveria ser criado fora da sociedade, isolado da sociedade, é pedagogia de Rousseau. No entanto, Rousseau chegou às suas conclusões mergulhando no mundo, e provavelmente no que havia de pior no mundo.

Um comentário:

João Marcelo disse...

Estou lendo o mesmo livro e até agora tenho achado muito bom. A narrativa dos autores é fluida mesmo quando trata de temas mais filosóficos. Aliás, o enfoque principal é dado sobre o clima do período sendo que tanto a filosofia de Hume quanto a de Rousseau são abordadas de forma bem leve no decorrer do texto.