São Paulo, quarta-feira, 14 de maio de 2008
ANTONIO DELFIM NETTO
A proposta Belluzzo
EXISTE UMA pressão sobre os preços, em todos os países do mundo, alimentada por uma combinação de fatores: 1º) a desvalorização da unidade de conta do mercado internacional, o dólar americano; 2º) para cada produto, o aumento depende da natureza dos fundamentais: da estrutura da oferta e da sensibilidade da demanda; 3º) a desesperada especulação dos "hedges funds".
O primeiro efeito é facilmente constatável comparando o "The Economist commodity-price index" (2000 = 100) medido em dólares (260 em abril) com o medido em euros (150 em abril): a mesma "cesta de produtos" custa 70% "mais caro" em dólar. O segundo é visível na forma incompetente e descuidada que o mundo tratou o setor agrícola: os países desenvolvidos, com subsídios ou "quotas", sustentaram sua agricultura ineficiente e impediram que os emergentes aumentassem sua produção; no setor mineral, estimulou-se a cartelização e o controle da oferta no curto prazo e, finalmente, no setor do petróleo, reduziu-se o investimento na pesquisa de reservas, na exploração e no refino. Seus lucros foram desviados para os "fundos soberanos". O Brasil não é (nem poderia ser) uma exceção.
Chegamos a abril com um IPCA anual de 5%, ligeiramente acima da meta (4,5%), mas dentro da margem de manobra do Banco Central.
Nossa dificuldade é que terminou a mágica de utilizar a política monetária para valorizar o câmbio e absorver choques externos. Como resolver o problema de manter o nível de demanda do setor privado e estimular o "espírito animal" do empresário para aumentar a capacidade produtiva sem exacerbar a pressão sobre os preços? É evidente que, sem a ajuda da política fiscal, a política monetária não poderá resolvê-lo.
Simplesmente aumentar a taxa de juros é uma custosa não-solução. A resposta está em cortar a demanda do governo. É preciso manter o superávit primário necessário para continuar a reduzir a relação dívida do governo/PIB (que exerce pressão sobre a taxa de juros) e, além dele, reduzir as despesas de custeio do governo.
Vai nesta linha a sugestão que o ilustre e competente professor Luiz Gonzaga Belluzzo apresentou ao governo. O superávit fiscal (excedente ao necessário para administrar a dívida) seria da ordem de 1% a 1,5%. Como há um "multiplicador fiscal" que depende das condições monetárias, da propensão a consumir e da propensão a importar, seu efeito sobre a demanda global seria próxima a 2% do PIB. Isso reduziria as pressões sobre os preços e não comprometeria a ampliação da oferta global que sustentará o crescimento futuro. Mas, para isso, o excedente deve permanecer indisponível na caixa do Tesouro.
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