Sempre que ocorre um evento de grande repercussão midiática, há uma sobrevalorização da importância dos fatos para o processo histórico mais amplo.
De fato, o maior impacto da morte de Bin Laden é na política interna americana, favorece a reeleição de Obama. Não poderia haver notícia pior para os republicanos. também aumenta a margem de manobra do governo Obama, ele havia perdido a oportunidade de fazer mudanças políticas mais significativas e foi rapidamente colocado numa posição defensiva. Agora tem condições de retomar a ofensiva e definir uma agenda de política interna e externa menos conservadora do que a que seguiu até agora. É improvável que isso ocorra, mas haveria maior margem de manobra na medida em que “provou” que tem condições de defender os EUA de seus inimigos.
É uma trivialidade, mas o terrorismo não acaba com a morte de Obama e nem mesmo a Al Qaeda está derrotada. A ausência de Bin Laden enfraquece a Al Qaeda, reduz a sua importância midiática, mas as características da organização, uma rede descentralizada, faz com que o movimento continue de forma relativamente independente em vários núcleos.
A morte de Bin Laden tem um impacto importante no Paquistão e no Afeganistão. No Afeganistão deve ter um efeito desmobilizador, uma sinalização de derrota sobre os seus aliados, e deve dar margem para uma saída controlada dos EUA, e um anúncio de fim da guerra similar ao que foi feito no Iraque, ainda que se mantenha focos de conflitos.
No Paquistão, deve aumentar as desconfianças recíprocas entre os EUA e o governo do Paquistão. Será cada vez mais difícil negar que o Paquistão é de fato o espaço de operação e formação destes grupos radicais. Impossível que Osama vivesse no país em completo anonimato e com a ignorância de todas as autoridades.
Osama não será um mártir de caráter universal, não será um Che Guevara que é invocado em todas as lutas sociais ao redor do mundo. Mas no contexto afegão e paquistanês, vários grupos o tomarão como mártir e exemplo para sua causa. Entretanto, isso deve ocorrer de forma mais acentuada com através do fortalecimento da militância islâmica mais institucionalizada. Os resultados práticos da militância de Osama Bin Laden na conquista dos seus objetivos foram pequenos para não dizer inexistentes. Então ainda que inspirados por seu ideal e por sua militância, a estratégia dos grupos islâmicos fundamentalistas deve mudar a partir do balanço que se faz dessa experiência histórica.
A morte de Bin Laden não muda as relações internacionais. Do mesmo modo, que o 11 de setembro, apesar do impacto midiático e das guerras justificadas por ele, foi um epifenômeno nas relações internacionais. A morte de Bin Laden não altera nada.
As relações internacionais nesta primeira década do século XXI foram marcadas pela ascensão da China, pela reorganização da economia mundial e crescimento dos países emergentes, pela reação defensiva dos EUA à redistribuição do poder em escala mundial através da crescente militarização, evidenciando uma contradição entre a dinâmica do capitalismo global e as instituições políticas que lhe dão sustentação. Esta contradição aparece na política externa americana ao impor duas tendências simultâneas, uma de maior institucionalização global das relações internacionais, e outra de maior militarização, e unilateralismo explícito. Se no governo Clinton a primeira parecia predominar. No governo Bush, o predomínio da segunda fez paralisar o avanço no primeiro movimento, que aparece no enfraquecimento da OMC e na crise financeira internacional.
As decisões de Obama e dos EUA a partir da morte do Bin Laden pode ter um impacto significativo nas relações internacionais. A morte de Osama Bin Laden é um epifenômeno, mais importante do que o casamento do príncipe William, mas ainda assim mais importante para a mídia do que para o curso da história.
PS: Claro, que ainda é preciso saber mais detalhes sobre a questão, esperar declarações da Al Qaeda, porque o que foi feito com o corpo precisa ser melhor esclarecido.
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